- em que o P.M. nunca teve curso ou profissão para além de actividade partidária até quase aos 40 anos (depois logo passou a administrador duma série de tachos empresas);
- em que grande parte do eleitorado não é digno desse nome, e sofre de amnésia selectiva;
- em que os ministros não precisam de ter uma sombra de qualificação nas áreas das pastas a que presidem;
- em que houve pelo menos um (ou serão 3?) P.M. que fez o mesmo que o comandante do Costa Concordia e ainda foi promovido;
- em que são os mais pobres a ter de fazer maiores sacrifícios para pagar dívidas que não contraíram;
- em que o P.R. se atreve a queixar-se das "pequenas" reformas (de vários milhares de euros) que ele e sua esposa auferem - qualquer das minhas avós poderia ensiná-lo a sobreviver dignamente e sem quaisquer dívidas, apesar de depois de vidas inteiras de trabalho árduo desde crianças, auferirem reformas de duzentos e picos euros; e não, as minhas avós nem sequer são professoras catedráticas de Economia;
- em que o P.M. sugere a emigração como alternativa para os desempregados;
- em que o património natural e cultural é sacrificado em nome do capital;
- em que o brio profissional é mais raro do que o chico-espertismo;
- em que a educação está subvertida para servir taxas de sucesso e não para efectivamente educar;
- em que a maior parte dos jovens licenciados está no desemprego, em que se instiga a que estudantes cuja formação é um investimento (grande) do Estado vão produzir riqueza para o estrangeiro;
- em que os criminosos não são punidos, em que os corruptos são reeleitos, mas nada disso mexe muito com o ânimo da malta, que o importante é ver a bola e beber as "mines".
Querem que goste de aqui viver? Desculpem lá, não gosto. Não sou particularmente patriota. Gosto de muitas coisas deste país, abomino outras tantas.
As minhas expectativas foram frustradas.
Fui (bem) educada, no pressuposto de que é o mérito e o esforço que faz avançar cada um e, por conseguinte, o colectivo. Investi muito, quase todo, o meu tempo, e muito dinheiro, na minha formação. Sempre fui a aluna mais aplicada, disciplinada e bem-sucedida no ensino obrigatório. Segui o meu sonho, porque estava convicta de que teria todas as oportunidades ao meu dispôr, se trabalhasse muito e bem. Trabalhei, muito e bem. Formei-me. Trabalhei muito, naquilo que gostava, em condições ridículas. Era mal-paga, não tinha benefícios sociais, estive a recibos verdes, mas acreditava que as coisas podiam mudar. Especializei-me. Fiz mais cursos extra-curriculares. Trabalhei de borla (porque nunca chegaram a pagar-me) para um instituto público. Continuei a trabalhar muito, a insistir, à procura dum emprego digno desse nome, que praticamente não existe na minha área. Vi quem tinha boas ligações políticas e familiares saltar muitos degraus à frente, independentemente do mérito. Depois duns anos a frustração aliou-se a problemas de outras ordens e bati com a porta. Arregacei as mangas. Fui à luta, disposta a fazer o que fosse preciso. Comecei a trabalhar numa área absolutamente estranha e diferente para mim. Ao fim de 3 meses apenas surgiu um convite para algo melhor dentro da empresa. Ao fim de uma semana no novo projecto fui convidada a liderá-lo. Correu bem. Trabalhei muito. O vínculo continuou a ser muito precário, mas a superação de objectivos valeu-me remunerações mais simpáticas. Quando surgiu o convite para um part-time na minha área agarrei com as duas mãos. Tive 3 empregos em simultâneo, 2 oficiais e mais um biscate numa terceira área completamente diferente. Consegui pagar a entrada duma casa com o fruto do meu trabalho. Quando acabaram aqueles projectos os convites renovaram-se se ambos os lados, mas com um crescente nível de responsabilidades; tive de optar, só podia ficar com um. Optei, provavelmente mal. Joguei pelo seguro, preferi ganhar (muito) menos e trabalhar na área oposta à da minha paixão com um contrato que me garantia estabilidade e paz, em vez de trabalhar numa área do saber próxima da minha, em algo que me deu muito gozo e teve óptimo feedback de todas as partes, pertinho de casa, a ganhar mais do dobro, mas era um emprego que só estava assegurado por seis meses, a seguir ninguém sabia. Escolhi a "promoção" do outro lado, o que implicou passar a trabalhar o triplo e ganhar metade. Também podia ter ficado no desemprego a ganhar o dobro, mas isso seria impensável para mim. Trabalhei muito, imenso. Fiz um mestrado. Tirei outro cursinho, comecei outra licenciatura. Sempre com resultados muito bons. Este emprego, que ainda mantenho, não me valoriza, não me recompensa, não me satisfaz. Gosto de 80% do que faço; não tenho é perfil para as implicações que este meio acarreta, o graxismo, a falta de transparência, os "yes men"; não gosto que a qualidade do trabalho e o esforço não sejam reconhecidos. Não há perspectivas de evolução na carreira, não há hipótese alguma de promoções ou aumento salarial. Cheguei a um ponto morto.
Vivo num país que me maltrata e que não me aprecia. Como numa relação de violência doméstica, não pode ser o hábito a manter a relação. A paz de espírito vale muito mais. E eu preciso de paz, desesperadamente.
Não, não gosto de aqui viver. Para além de tudo o mais, e acreditem-me, há muito mais, é Portugal que me desgasta.
Este ciclo tem de ser encerrado. Duma maneira ou de outra.