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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

origem

Digo-o tantas vezes, sempre e cada vez mais, com a maior das convicções para além de tudo o que é tangível. "O meu pai é o melhor do mundo." A melhor amiga sabe-o de cor e repete-o comigo, a colega do lado acena com a cabeça. O meu pai é o melhor pai do mundo. O primeiro a descobrir-me o gosto pelo ares, ainda lhe cabia na palma da mão, e não esqueço. A minha primeira palavra foi papá, e ele nunca chamou filha a mais ninguém. Ensinou-me tanto, o meu pai, continua a ensinar-me todos os dias. O pai que me deu tudo, até uma (única) palmada, por ser tão igual a ele. O pai que me levava a ver os treinos, a passear na areia ou no pinhal. De quem herdei a cara, os olhos, o cabelo, a rectidão, o mau-feitio, a intempestividade, a paciência, a curiosidade, as bochechas, o gosto pelas ciências, o gosto pela escrita, as asas, os passeios sem planos nem destino, o olhar fotográfico, os traços no desenho. A bem ver, quase tudo o que sou herdei do meu Pai.


Pai brincalhão, que me partiu a cabeça com um ataque de cócegas, que largou o único vício porque lhe pedi tanto, que respeitou todas as minhas escolhas, que é o primeiro a ajudar quando nem eu sei que preciso de ajuda, que cala se as palavras me magoam, que vai a correr se estou aflita, que não questiona quando lê os meus olhos.


Dia do Pai é todos os dias, porque todos os dias todo este Amor maior está presente, seja como for.


 


O meu pai é o melhor do mundo.

 

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As grandes, enormes, histórias de amor, não deviam acabar. Porque ao acabarem acabam com a capacidade de se voltar a amar, porque não há tempo que cure a mágoa, porque as outras pessoas deixam de existir.

 

Porque há amores que deixam o peito estéril, vazio, seco, de tanto que deram, de todos os inícios terem secado por falta de alimento. O teu amor foi sal no solo do meu coração. Onde toda a vida teve lugar, nunca mais pode vingar nada. Nunca. Nada.

 

Preferia que me tivesses morrido. Preferia agarrar-me a uma força maior, a uma injustiça dos deuses em que não acredito; passaria a acreditar só para sonhar em voltar a ter-te. Preferia saber que o amor que juraste para todo o sempre podia ser mesmo para sempre. Sempre... Ceifaste-me o gosto pela vida, levaste-me a todos os extremos. Porquê, para quê?! Quem és tu, demónio, que foste a promessa de tão mais do que ousei sonhar, e tiraste tudo de mim, o respeito, a sanidade, o ar.

 

E que me queres quando regressas nas entrelinhas do meu sono, quando sinto a tua respiração na minha orelha, oiço a tua voz e o teu cheiro se me entranha na pele. Deixa-me em paz, nem fantasma sabes ser, esses têm a decência de falecer primeiro! Não quero a tua presença ao meu lado, nem afagar-te a mão quando deitas o braço sobre as minhas costas, não preciso dos teus pedidos de perdão que se esfumam no ar. Incomoda-me o teu espírito colado a mim, tão palpável que luto entre o acordar e deixar-me ir, e é nesse limbo que aflige mais, sabendo que ali não estás porque não podes estar e sentir o teu calor, a tua voz, os teus dedos, o teu peso a entalar-me nos lençóis e a tua barba.

 

Deixa-me em paz, a definhar em silêncio no vácuo do que já fui.