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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

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Não é a unanimidade que atesta o valor de alguém ou da sua obra. Não é por ter sido um ícone musical da sua geração que o Zé Pedro deixa um generalizado sentimento de perda em, arrisco dizer, toda a gente. A morte do Zé Pedro comove toda uma nação, independentemente de se gostar ou não da música dos Xutos. [Eu gosto, muito, e perdi a conta ao número de concertos dos Xutos a que assisti, em tantas ocasiões e palcos diferentes, da Festa do Avante a concertos privados, a cantar cada refrão.] A morte do Zé Pedro não precisa de artigos nos jornais a recordar os seus feitos ou a limpar as suas nódoas, porque o seu valor - sobretudo humano - não deixou margem para dúvidas em vida. O Zé Pedro ganhou-nos o respeito e admiração de cada vez que falava em público, com sinceridade e sem peneiras, como um amigalhaço de toda a gente, como um de nós, com as suas merdas, com dias maus, com bondade e alegria, com erros e com sonhos; de cada vez que falava dos seus problemas de saúde, dos vícios que deixou para trás, da música ou do amor, cada um de nós era um bocadinho Zé Pedro.

A comoção nacional com a morte do Zé Pedro não se pode fingir, não se pode contornar, não é passível de indiferença. Não há qualquer margem para polémicas e divergências. Qualquer homenagem que se lhe faça é merecida porque todos temos o Zé Pedro num cantinho do coração. Qualquer pequena manifestação de pesar pela morte do Zé Pedro tem de sobra aquilo que falta em outras, movidas por interesses, pelo politicamente correcto, por tentativas de limpeza de vidas cheias de podridão opressora e exploradora: honestidade.

Tomara que quando eu morra, me recordem assim, pelo sorriso e por nunca ter traído a minha classe em palavras ou em actos, por ser igual para todos, por igual.

Se calhar sou só eu que tenho uma tendência para rodear-me de pessoas com fracas habilidades sociais, ou então será um mal geral dos dias que correm. Parece-me que se tornou penoso dizer-se coisas absolutamente corriqueiras, mas essenciais, como "obrigado", "desculpa" ou "tens razão". Andam em bicos de pés a assobiar para o lado, perfeitamente cientes de culpas e erros alheios, sem hesitação na hora de apontar dedos, mas quando lhes toca na pele já se afastaram por entre os intervalos da chuva. Não dói nada dizer as palavras mágicas e evitavam dúvidas, ressentimentos e mágoas. Talvez as prefiram, para atestar a sua própria pouca recomendabilidade.