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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

origem

 

A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste

A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos

A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste"

Aguarda pacientemente no escuro, observa com cuidados cada detalhe, ao longe, em silêncio, sem se fazer notar, de mãos nos bolsos a forçar uma atitude blasé. Com vontade de aventura, sim, mas sem grande certeza de querer arriscar. Hesita e calcula, calcula e hesita. 
Gosta de partilhar a melancolia mas odeia ter de a explicar. Tem uma voz possante que ocupa todos os espaços, tem uma presença vincada que quase o mascara. O discurso tem falhas, sobretudo nas costuras, frouxas por serem impermeáveis às razões alheias. A postura de macho alfa leva ao engano, ele aprecia a protecção que lhe dá de quem o julga capaz de tudo. Preso numa vida que o esmaga e sufoca, cheia de horários, frustrações, contas e obrigações, tudo o que queria era algum silêncio, paz, tempo para se esquecer e leveza para encontrar a alegria do seu sorriso espelhado no de um filho. Não cede nunca, resiste a tudo, e pensa que é isso que o faz parecer invencível. Atrás de cada porta que fecha, por força do orgulho desmedido em continuar só, deixa um amigo vazio, sem mais nada para dar. Isolado no alto do seu castelo de distâncias caladas, grita e esperneia Baltasar. Se é som ou silêncio que fala, não importa, que as muralhas em volta são blindadas e dentro delas só circula o ar. É um gigante pateta, recto e honesto, triste por estar só, mas não deixa vivalma se aproximar. Quer que lhe leiam nos olhos as histórias difíceis e a solidão, que se confirme que é raro e especial, mas é profissional das fugas, não pára quieto no mesmo lugar. É um menino pequeno, carente de colo e de cumplicidades, brinca com frases e corações, morde e pisca o olho, mas sempre sem se dar. Gostava de encostar a cara a alguém que não o julgue e só descansar. Gostava de receber beijos molhados, não antecipados, abraços apertados. Gostava de não ser um maneta emocional, de se deixar erguer quando outros braços o tentam puxar. Queria ser outro, noutro lugar. 

[Podia ensinar-te a sorrir, se desaprendesses a calar.]

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Sempre a melhor amiga, a companheira, amiga, camarada, o ombro amigo, confidente... mas nunca a mulher desejada. São décadas disto, e cansa. São décadas disto, e dói. Por uma vez que fosse, gostava de saber qual é a sensação de se ser o objecto de desejo e atenção de alguém. Gostava de saber que suscitava a lascívia pura de alguém, sem se deter com as intelectualidades, que me dizem intimidar os outros, sem haver egos gigantes carentes de atenção, sem dramas nem complicações, sem solidões a pedinchar um mimo para aplacar uma dor causada por outra. Por um momento, gostava de poder ser só uma mulher interessante que deixasse um homem com suores frios, com borboletas no estômago, doente de desejo, louco de tesão. Por um momento, gostava que o meu ego fosse mais importante. Gostava de deixar de me preocupar, gostava de conseguir largar, gostava de ser capaz de não gostar. Décadas disto, e cansa, e dói.

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Asi ando yo
Cantando aun mis penas
queriendo que me ames
para mi soledad

Y hasta que yo te quiera
Que quieres que te cante?

Por eso me quedo
Ay Ay Ay hasta el final

Y asi amo yo
con rimas tan torcidas
buscando disonancias
Pa'mi nueva cancion

Y hasta que yo te quiera
Que quieres que te cante?

Por eso me quedo
Ay Ay Ay hasta el final

Y asi amo yo
con rimas tan torcidas
buscando disonancias
Pa'mi nueva cancion

Y hasta que yo te quiera
Que quieres que te cante?
Y hasta que yo te quiera
Que vale lo que cante?

Por eso me quedo
Ay Ay Ay hasta el final

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