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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

origem

Cabelo comprido, sujo e desalinhado, gabardine, que já teve outra cor por baixo do encardido, vestida sob o calor imenso do fim de Julho. Passou por mim, mais um anónimo nas ruas da cidade, nas estatísticas do desemprego, diluído nas misérias que proliferam ao ritmo dos enriquecimentos dos mais ricos desta terra.


Limpava duas lágrimas grossas com os dedos, sobre as faces vermelhas de sol ou de raiva ou de vinho - não interessa. Fico com esta imagem colada às retinas, raios partam esta imbecil empatia, incontrolável, que me empola as sensibilidades e faz-me ter de lutar contra as lágrimas se não estou só, nas situações à partida improváveis. [Aprendi desde cedo a contrabalançar com brutalidade e pragmatismo tais que consigo deixar os outros chocados. Óptimo. Tudo menos ser chorona ou queridinha.]


Penso se será o toque das suas próprias mãos o único que sentiu hoje, esta semana, nos últimos meses. Penso em mil motivos que podem justificar aquele choro. Uma zanga, fome, rejeição de uma última esperança, uma filha que passou e não o reconheceu. [A minha mente melodramática está sempre a produzir argumentos televisivos, em todos os pormenores quotidianos, até a sonhar.] Penso, inevitavelmente, quão sortuda eu serei por desconhecer o tal motivo. Que podia ser banal e desinteressante como o seu clube de coração ter perdido um jogo. Só que eu sei que não era, e não sei como sei. 



 

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