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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

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Alguém a quem dar um beijo de bom dia quando se acorda.

Alguém em quem aquecer os pés no Inverno e aninhar a cabeça no peito em qualquer dia.

A quem dar um beijo urgente só porque sim.

Alguém com quem partilhar o duche, as contas da casa, todos os poemas e abraços.

Alguém com quem construir as ideias, partilhar ansiedades e episódios ridículos.

A quem confiar os medos e os desejos mais absurdos.

Alguém com quem chegar a casa e adormecer de mãos dadas.

Com quem fazer planos de viagens, de remodelações, de projectos, dos nomes dos hipotéticos filhos.

Alguém a quem conhecer de olhos fechados, perceber pelo ritmo da respiração se está a dormir, a ler ou a ter uma tontura.

Alguém a quem pentear a barba e ajeitar o casaco e gritar quando está a ser idiota. 

Com quem ter olhares cúmplices que inflamam ataques de riso.

A quem quase tudo perdoar e com quem errar sem medo de perder.

Alguém a quem pedir mimos, fazer surpresas e morder as orelhas.

Alguém em cujos olhos perder noção do tempo ou da inconveniência do sorriso.

Com quem dar guinadas bruscas na vida, mudar tudo, virar do avesso e tornar a repor tudo no seu lugar.

 

Alguém a quem amar de volta.

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É no teu peito que me aninho para voltar a casa. É contigo que partilho mais do que alguma vez ousei pensar que poderia partilhar. É por ti que me viro do avesso e respiro quando antes podia gritar e latejar todas as raivas. Sabes quais os pontos das minhas costas que me fazem gemer e qual o ritmo em que gosto de te sentir.

Apoias-me as ideias mais loucas, não me cortas nunca as asas, por mais disparatado ou picado que seja o vôo. Vens comigo para as aventuras longínquas que invento, aturas-me as birras, as dores, os delírios e os sonhos inalcançáveis. Tiras-me do sério e excedes todos os meus limites. Sobretudo o do amor.

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Amo-te.

Adultério é uma palavra violenta e desnecessária como comprova “A Letra Escarlate” (“The Scarlet Letter” no original) de Nathaniel Hawthorne, que significa violação da fidelidade conjugal.

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Segundo o Código Civil português em vigor, "O casamento é um contrato entre duas pessoas que pretendem constituir família em plena comunhão de vida, que se baseia na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. A direcção da família pertence a ambos os cônjuges, devendo os mesmos acordar acerca da orientação da vida em comum, tendo em conta a família e os interesses de cada um”.

Deve ser defeito da minha mentalidade pouco progressista, mas faz-me espécie como alguém pode contratualizar algo que, à partida, é motivado por sentimentos. Ou seja, como se pode contratualizar o amor ou mesmo o afecto? Não compreendo e recuso-me a contratualizar uma promessa que não sei, e ninguém sabe, se será cumprida. Mas novamente admito que possa ser um problema do meu entendimento e até admito que possa vir a mudar de ideias.

Depois há as obrigações legais do casal...

Pelo casamento os cônjuges ficam vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação (obrigação de socorro e auxílio mútuos e de assunção em conjunto das responsabilidades inerentes à vida da família) e de assistência (obrigação de prestar alimentos e de contribuir para os encargos da vida familiar)."

A fidelidade é uma obrigação dos cônjuges. Não sou jurista, mas suponho que a quebra de uma destas condições contratuais possa ser fundamento para a denúncia unilateral do contrato. E pronto, podia ser tão simples quanto isto. Só que não é. A carga moral da infidelidade é pesadíssima, e como temos vindo a constatar entre o choque e a impunidade, com um diferencial muito grande entre géneros.

A meu ver, as relações sentimentais e sexuais não são matéria passível de estarem sujeitas a interferências externas. Cada qual deve fazer o que bem entender sem dar satisfações a partes não interessadas. Aliás, enquanto avaliação moral a fazer nestas matérias só defendo a verdade, até porque defendo a verdade acima de tudo. Se não houver mentiras nem segredos, nada a esconder, e ninguém se magoar, o que é que a justiça, a moral, a religião, a sociedade têm a ver com isso? [Podia discorrer sobre o tema, sendo previsível que o tema virasse para a apologia da poligamia e do poliamor, mas deixo para outra ocasião.]

 

Quem somos nós, qualquer um de nós, para limitar a liberdade dos outros?

 

Há semanas difíceis e surreais, há semanas tristes e de oscilações drásticas ao jeito de montanhas russas... Esta foi uma delas. Em oito dias, postos de trabalho em risco, incerteza, um encontro com pessoas de quem gosto muitíssimo e que temi que culminasse em batatada, discussões e desconfianças e lamentos e dúvidas, emergências de hospitais, um pedido de casamento e o falecimento de um familiar. Porra. E o fim-de-semana já a acabar sem pré-aviso, além da chuva prevista para amanhã.

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Adoro, é o meu padrão preferido, intemporal, cheio de classe sem ser monótono... Enfim, é uma paixão aqui da menina.
Olhando de soslaio ali para o cabide de pé onde está (des)arrumada a roupa passada, vislumbro seis peças de bolinhas. Temos branco com bolinhas pretas, temos preto com bolinhas brancas, temos azul escuro com bolinhas brancas (em maioria) e temos bordeaux com bolinhas brancas.
No dia em que encontrar um vestido que me agrade (sou muuuuito esquisita com os vestidos) com bolinhas pretas ou brancas em cinza, terei de marcar casório para o usar. Just sayin'.



 



Da primeira vez que estive em Amesterdão, fui sozinha. Estava um frio de rachar. Não percebi todo o deslumbramento generalizado com a cidade. Achei gira e tal, mas suja e completamente sobrevalorizada.
Da segunda vez, fui com uma amiga. Estive mais tempo, o tempo estava frio e chuvoso, e conheci mais coisas, mas continuei a ter uma opinião morna. Tudo caro, algo sujo, sem nada que fascinasse.
Desta vez, fui contigo. Não choveu, mas também estava bastante frio. Só que, desta vez, tudo me pareceu bonito, sereno, em sintonia. O Sol brilhou. Realmente um raio de sol faz toda a diferença na Luz, nos reflexos, no estado de espírito, nos sorrisos das pessoas na rua.
Passeámos muito de mãos dadas, fizemos piqueniques improvisados nos parques, apanhámos estafas nos museus. E a cidade ganhou outra cor, outro encanto adocicado, suave e afável como a superfície do Amstel num dia de Primavera.
Já viste como pode apenas o Sol mudar tudo em nosso redor e dentro de nós?

Quando estivemos em Paris também senti o mesmo, as ruas dos subúrbios encantadoras, cada detalhe fortuito engraçado e simpático, e até a língua, de que nunca gostei, me pareceu menos presunçosa e mais aberta e interessante. Também deve ter sido o Sol a fazer a diferença, tão grande diferença em cada momento. A cidade abraçou-nos, estendeu o tapete vermelho e convidou a ficarmos para sempre numa pintura de Saint-Lazare.


Só que em Paris não vimos o Sol, choveu o tempo todo.


Os vizinhos mudaram-se.

 

É toda uma nova experiência viver aqui sem partilhar uma parede com aquelas pessoas fofinhas. Já não se entra em casa com sacos de lixo ou sapatos alheios à porta, já ninguém grita hstericamente "CAAAAAAAALAAAAA-TE CABRÃÃÃÃÃOOOOOO!" quando o recém-nascido chora, nunca mais houve um puto de 8 anos sentado no nosso tapete de entrada a ser calçado pelo "pior pai do mundo".

 

A nossa vida agora é um marasmo. Se não pusermos despertador até corremos o risco de acordar ao meio-dia aos fins-de-semana, porque já não há aquela emoção da berraria de sábado às 8 ou as portas de armário a bater repetidamente aos domingos às 9.

 

Conclusão: vou ter de gritar mais com o gajo e ameaçar esfaqueá-lo (mais vezes) só para poder matar saudades. ♥

 

Nos últimos anos, tenho dado por mim a gostar de alguma ficção televisiva que, à partida, diria que não me interessaria por aí além. Um exemplo imediato (entre outros): Walking Dead. Resisti bastante no início, das pequenas partes que já tinha visto lembro-me de achar inúmeras falhas no enredo e na caracterização dos zombies, por exemplo, mas perante a insistência do homem, lá tive de papar acedi a ver as 3 ou 4 temporadas iniciais.


Fiquei "agarrada". Ainda hoje faço os mesmíssimos comentários às incoerências científicas (e não só) que vou apanhando, ou a coisas que me intrigam (tipo o cabelo do Darryl ser SEMPRE oleoso, mesmo depois de tomar duche!...), mas a verdade é que me tornei fã da série.


Pensando a sério sobre o assunto, concluo que os enredos distópicos, quando bem explorados, atraem o público em geral por demonstrarem, com recurso a situações extremas, a verdade nua e crua sobre a natureza humana:



  • Somos animais - e tantas vezes nos esquecemos que somos regulados principalmente por instintos e toda uma herança genética que busca apenas a propagação da espécie, atendendo às necessidades básicas em primeiro lugar, e só depois a considerações morais, filosóficas ou teológicas. Antes de sermos seres cientes, somos bichos.

  • A sobrevivência do mais apto é a regulação natural do sistema; todos morrem, os mais fracos/menos adaptados morrem primeiro.

  • As pessoas nunca mudam! Podem apurar alguns traços de personalidade ou aprender algumas coisas, mas a essência de cada um é essencialmente imutável. Somos fracos, temos vícios, erramos, e a história repete-se porque não se consegue fugir a quem somos.

  • Ninguém é inocente. Nem crianças, nem personagens insuspeitos que foram "bonzinhos" e almas caridosas a vida toda - aparentemente. Todos temos segredos, falhas, vergonhas ou arrependimentos.

  • Todos podemos ser monstros; en circunstâncias extremas vamos buscar forças escondidas e somos capazes de fazer TUDO (mesmo tudo!), para proteger a prole, o clã e a nós próprios (não necessariamente por esta ordem).

  • Os momentos extremos trazem à tona o melhor e o pior da humanidade. Como descrente na Humanidade em geral, desconfio que isto seja mais verdade na ficção do que na realidade, mas dou o benefício da dúvida. Se calhar todos temos um herói cá dentro, mas se calhar também todos temos um vilão à espera de oportunidade para se revelar.

  • Não há bons nem maus. Isto é o que mais me fascina nos cenários distópicos, na televisão, mas sobretudo na Literatura (arte maior, a meu ver), como comprovam grande parte dos clássicos mais geniais. Ao contrário da ficção banal e sensaborona, os grandes mestres conseguiram captar nas suas obras o âmago da essência humana. Não há bons versus maus, não há preto no branco. Todos e cada um de nós somos ambas as faces da mesma moeda. A sangue frio, a análise duma qualquer cena cruel, descontextualizada, leva-nos a tecer quase imediatos juízos de valor. E depois, quando nos envolvemos com a história, e com uma sólida construção dos personagens, invariavelmente criamos empatia, solidarizamo-nos, compreendemos os "actos atrozes" e às vezes passamos a simpatizar com os "malfeitores", porque nos revemos. Porque ninguém é sempre canalha, ninguém é sempre bonzinho, porque ninguém é perfeito nem infalível. Porque isso é ser humano.


Nos dias 14 de Fevereiro que passei, desde a adolescência, sem namorado (e foram muitos), sofri. Porque parecia que toda a gente tinha alguém com quem partilhar não só a data, mas a vida, menos eu. Toda a gente estava feliz e eu acreditava que iria ser infeliz a vida toda, que nunca ia ter uma alma gémea que me compreendesse e que gostasse de mim. Via casais de mãos dadas em todo o lado e, apesar de nunca dar parte de fraca nem lamentar-me em voz alta sobre o assunto, sofria. Sofria calada, chorava até, de uma solidão que via como sentença ou premonição. Às vezes chegava a comprar prendas, quase sempre perfumes, para mim própria, como forma de me mimar nesse dia em que me sentia tão pouco amada, o que me tornava mais triste ainda.
Depois as coisas mudaram.
Desculpem a frase feita mas comigo foi mesmo assim: primeiro, tive de aprender a gostar de mim, e só depois acreditei (e permiti) que outras pessoas também gostassem.
E então passei a ter um jantar romântico a 14 de Fevereiro, declarações de amor e corações, tudo cor-de-rosa e exactamente como os filmes de Hollywood nos ensinam que deve ser o amor. Todos estes rituais ocos, mas idênticos ao que o resto da tribo cumpria, faziam-me sentir normal, ou pelo menos "como as outras pessoas", e durante algum tempo pensei que a minha insatisfação era uma falha minha, que o amor era mesmo assim, uns dias melhores e outros piores, um contínuo esforço de compromisso e cedências mútuas - que não serviam a nenhuma das partes.
Os ciclos repetiram-se umas poucas de vezes, em nada iguais, em tudo idênticos.

 

O que me salvou foi a descrença. Questionei demais, e deixei de me conformar. Também deixei de acreditar no Amor e na minha sanidade mental, fiz um esforço para ver a vida com um olhar frio e cínico. Decidi que se o amor era aquilo, então não servia para mim, e fiz-me à vida. Sempre soube que o que quero para mim não está nos cânones, não é previsível nem está escrito em lado nenhum. Deixei de me importar. Tinha coisas mais importantes a acontecer para me perder em lamentos.

 

Nunca olhei para trás. Não procurei, cheguei a resistir, e não tive como fugir. Aconteceu. Num ápice, mas sem pressas. Porque tinha mesmo de ser assim. Quando é óbvio, não há porque adiar ou recear. Não importa para onde vamos, se vamos juntos no mesmo caminho.

 

Agora, não preciso de presentes e corações desenhados para a fotografia. Agora, o Amor não tem dia marcado porque existe, entranhado suavemente em cada gesto, todos os dias. Agora, o 14 de Fevereiro é tão especial como o 12 ou o 13. Agora, também há cedências e compromissos, mas há mais do resto, da intimidade e cumplicidade, do carinho, da calmaria das certezas, sempre em crescendo, com segurança e em pleno. Agora já não sei dissertar sobre o Amor. Já não sei o que é sofrer por falta dele. Só sei que ele não é nada do que se vê nos filmes e será diferente para cada um. Para mim é um barbudo branquelas que me irrita como ninguém e que me dá abraços que valem o mundo. Agora, é Amor.

 

 

 

1. Manuel Maria Carrilho


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Isto sim, é amor! Bebia só para que ela não bebesse tudo sozinha. É o que se chama partilhar o fardo. (Por acaso eu também faço o mesmo, não posso ver o homem a comer um pedaço de chocolate que me atiro logo a ele e roubo-lhe uns quadrados, só para ele não comer tudo, que lhe faz tão mal...)


Além disso, Manuel Maria Carrilho compara ainda os seus livros a filhos, que foram maltratados e atirados para dentro de caixotes (os livros), como se fossem batatas. As batatas às vezes também têm olhos negros, os livros não sei...


 


2. François Fillon



François Fillon foi um marido do caraças, tendo arranjado uns piquenos biscates à sua esposa, que não davam muito trabalho (quase nada, na verdade) e por isso pagavam pouquito. Além disso, é ainda um pai do caraças, tendo ajudado os seus filhos na difícil integração no mercado de trabalho mesmo antes de terminarem os cursos.


 


3. John



 


Escolha difícil...


 

O meu homem tem um problema grave. Pensa que me chamo Google. Todos os dias - repito, toooodos os dias - dispara perguntas aleatórias, sobre qualquer tema, desde ciência a culinária, a qualquer momento, e espera pela minha resposta. Eu até gosto, confesso, de perceber o que fervilha naquela cabeça a mil à hora, por detrás daqueles olhos cor-de-mel. Depois irrito-me porque antes de terminar uma resposta já ele está a fazer outra pergunta. Mas o que me irrita mais é quando lhe digo que não sei, porque ele faz-se de indignado a pensar que eu não estou é com pachorra para lhe responder. "Como não sabes?! Sabes sim senhora! Tens de saber estas coisas!"


Da mesma forma que há pessoas que pensam que todos os advogados têm de saber todo o código civil/do trabalho/penal de cor, ou que todos os físicos têm de saber todas as teorias da física na ponta da língua, o meu homem acha que eu tenho de saber tudo sobre quase tudo, qual poço sem fundo. Talvez assim ele perceba: "Não sei, pesquisa na Internet! Eu não sou o teu Google!"


Porque numa família todos têm o seu papel, e é importante realmente partilhar as tarefas em vez de apenas esperar "uma ajudinha".

Aplicável a filhos menores e também a maridos-que-nos-vieram-parar-às-mãos-muito-mal-habituados.

(E a este propósito tenho de orgulhar-me muito do meu, que com menos de 4 anos - de casamento - já está bastante à-vontade em tarefas apontadas para meninos a partir dos 9/10 anos, apesar de ainda estarmos a trabalhar naquela cena de guardar os brinquedos. Mas chegaremos lá.)

 

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Pessoa tem a mania que tem dotes de Masterchef.

 

Pessoa aproveita fins-de-semana e feriados para cozinhar.

 

Pessoa acorda cheia de vontade no 1º de Novembro, toma duche, segue a cantarolar para a cozinha.

 

Pessoa está feliz com a adopção de um estilo de vida paleo e decide inventar uma receita com ovos e courgettes para o pequeno-almoço.

 

Pessoa agarra numa courgete linda e na sua mandolina verde e começa a cortar rodelinhas de courgette.

 

Pessoa está tão embalada que corta também uma rodela de dedo.

 

Pessoa tem sangue frio e reacções rápidas e corre para a torneira, deixando correr água fria sobre o dedo decepado.

 

Pessoa pede ajuda ao marido informático enquanto faz garrote com a outra mão, porque há demasiado sangue a jorrar.

 

Marido informático acode com... um penso rápido. Dos pequeninos.

 

 

(Pessoa teve de ir para o centro de saúde e daí para o hospital para tratar a sua mutilação. Pessoa aproveita todas as hipóteses para contar a história do penso rápido. Todas as pessoas que ouvem a história sugerem alguma forma de mutilação do esposo informático, mas pessoa sabe que o esposo não ter desmaiado com a visão do dedo e do sangue já foi muito positivo. )

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(Acho que ele tem uma secreta estratégia de fazer asneiras ou dar tiros ao lado nas tarefas domésticas, com esperança que eu desista. Azar: quanto mais disparates fizer, mais prova que é preciso insistir para aprender a fazer bem. Dá muito trabalho educar um marido que não foi devidamente ensinado, mas vai chegar o dia em que não vai ser preciso ser eu a dizer e a pedir que faça isto ou aquilo - aquela conversa do marido "ajudar" em casa aqui não pega, as tarefas são dos dois em igual medida, somos sócios igualitários. )

Eu viajo algumas vezes a trabalho. Esta semana é uma dessas, e estarei fora a partir de amanhã. Por isso mesmo, hoje tive de trazer comigo uma série de coisas além das habituais (mala, marmita e afins), nomeadamente o computador portátil (a que chamo, carinhosamente, "o trambolho", porque é pesado como o raio), o carregador, o rato, mais umas coisas necessárias ao sítio para onde vou. Ainda não preparei a mala, não me posso esquecer de uma série de coisas que tenho de preparar esta noite, nomeadamente pintar as unhas, que o verniz do chinês é mesmo excelente, mas as minhas unhas crescem tanto que já se vê a parte branca e não posso passar o resto da semana nestes preparos.


Entretanto, o gajo decidiu ir ao futebol, ver o Tondela (Tondeeeeeelaaaaa!) contra não sei quem. E lembrou-se de me pedir para levar a mochila dele para casa. Hoje. Porque já vou pouco carregada. E só apareceu mais tarde do que partiu o transporte que eu devia ter apanhado. Porque eu hoje até nem tenho pressa nenhuma. Grrrrr!


Se isto não é amor, não sei o que será.

Os nossos vizinhos eram terríveis. Várias vezes estive para chamar a polícia, tal era a animosidade das coisas. Um casal e um puto. A senhora tinha ataques histéricos e gritava, do fundo da sua capacidade torácica, gritava muito. Às vezes gritava com o filho, normalmente um gutural "caaaaaala-te!". Outras vezes gritava com o Universo, ou assim me parecia, só um grito de horror, ou desespero, ou se calhar cansaço. Sei que a primeira vez que ouvi um destes gritos pensei que estava a ocorrer um crime, ou que tinha sido encontrado alguém morto. Quando uns segundos depois o grito se repetiu, com uma intensidade menor e mais umas palavras a acompanhar, percebi que afinal era algo bem menos dramático e larguei o telefone (já estava a ligar para a PSP). Mas os gritos piores eram os gritos dirigidos ao marido, pela frequência, intensidade e sobretudo pelas frases horríveis que veiculavam. Desde "és o pior pai do mundo" a "espeto-te uma faca na cara" ou mesmo, para o filho, "o pai odeia-nos, odeia a mãe e odeia-te a ti", com uma palavrões pelo meio, tudo era possível.


Depois as coisas acalmaram bastante. Tanto que chegámos a pensar que se tinham mudado. Mas não. Tiveram mais um filho.