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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

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Uma coisa que me indigna (também tenho direito, ‘tá?!) é quando se cumprimenta cordialmente alguém, com um corriqueiro – mas essencial – “Bom dia!” ou “Boa tarde!” e não se obtém resposta alguma. Deve ser mau-feitio meu e as pessoas são só duras de ouvido ou distraídas.

 

Já quando isto é prática repetida sem excepções, tira-me realmente do sério!

 

Como para mim é uma questão da mais básica educação, mantenho a minha postura e faço questão de continuar a dizê-lo de forma inequivocamente audível (nas primeiras 15 vezes ainda penso que sou eu que estou a falar baixo demais, o que é normal em mim) a estas pessoas muito concentradas ou atarefadas demais para cumprimentar os outros seres humanos. Nos dias em que estou particularmente atravessada repito, quase aos berros “BOM DIA!!!”. Temo que um dia perca noção de onde estou e dê uma cabeçada a alguém. Hoje ainda não foi o dia… mas quase!

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Importa notar que não há, não faz sentido que haja, não pode haver (!), uma "guerra" entre o ensino público e o ensino privado.

 

A questão por detrás da demasiado empolada celeuma com os contratos de associação deveria ser, para qualquer pessoa com dois dedos de testa, absolutamente óbvia. Se não há alternativa pública em determinada área, ou deve o Estado criar essa alternativa ou deve, aproveitando as sinergias já existentes, financiar parcialmente o ensino privado nessa área. Existindo suficiente oferta pública, não faz o menor sentido que o Estado financie o ensino privado. Ninguém obriga pais e alunos a mudar de escola, como tanto se tem ouvido e lido por aí. Claro que têm todo o direito de preferir e escolher o ensino privado, também há quem prefira andar de Rolls Royce em vez de andar nos Mercedes da Carris; o que não cabe na cabeça de ninguém é que o Estado financie o Rolls Royce, ou o ensino privado, quando esta oferta é supérflua.
Posto isto, e assumindo desde já um velho e embutido preconceito em prol do ensino público, exerço o meu direito de discordar em absoluto dos amarelóides e de grande parte dos outros, ou seja, de todos os que partem do princípio de que o ensino particular é melhor ou superior ao ensino público.


Em primeiro lugar e como sempre, esta é apenas a minha opinião, pessoal e intransmissível. Mas é uma opinião fundamentada numa longa, longuíssima carreira de estudante, sempre no ensino público. Tirando o pré-escolar (no meu tempo não havia oferta nem frescuras), que passei numa ama, que era no fundo uma avó sem laços de sangue, só estudei no ensino público. E não foi coisa pouca: tudo somado, 22 anos! Ensino até ao 12° ano em 3 escolas (primária, ciclo e secundária). Depois uma licenciatura de 5 anos, com estágio no mesmo estabelecimento. Algum tempo depois, uma pós-graduação. E depois um mestrado. E passados uns anos, já em pleno exercício da minha actividade profissional e com todos os condicionalismos que isso implica, uma outra licenciatura, num outro estabelecimento de ensino superior público.

 

 

 

Porquê? Porque pude. E podendo, escolhi, e escolheria sempre, o ensino público sobre o privado. Só de pensar em liceus particulares, nas fardas e no mundo hermeticamente fechado a que os putos se acostumam como se aquela amostragem representasse o mundo real, dá-me arrepios. Obviamente que compreendo quem não tem melhor alternativa por mil motivos, quaisquer que sejam. O que não engulo é que se pense que (no ensino e no resto, aliás) "se é mais caro, é melhor". Pelo menos no meu meio e na altura dos meus 17/18 anos, só ia para uma universidade privada quem não tinha notas suficientemente boas para entrar numa universidade pública. Não será grande novidade, se em Portugal e na zona de Lisboa pensarmos no melhor sitio para estudar Ciências, é a FCUL, se pensarmos no melhor sítio para estudar engenharias, é o IST (e o ISEL não se fica muito atrás), para Letras é a FLUL, para Arquitectura é a FBA, para Direito a FDL, por aí fora.

 

 

Se as condições foram alguma vez as ideais? Não, nunca. Nem lá perto.

 

A primeira manifestação em que participei foi precisamente pela melhoria de condições da minha escola secundária (algures pelo 7° ou 8° ano), porque tínhamos aulas nuns "galinheiros" de paredes de esferovite onde chovia no inverno e cozíamos no verão. Nem sempre tive como opção possível algumas disciplinas que gostaria de ter. Nem sempre tive professores excelentes. Tive uma professora de História que só aparecia de 15 em 15 dias. Houve um ano em que tive 3 professores de matemática diferentes. Tive uma professora que tinha medo de sair sozinha da aula porque uma aluna da escola a tinha ameaçado. Mas também tive professores excepcionais, capazes de nos ensinar, motivar e influenciar. Estive em turmas com sérios problemas comportamentais, vi colegas serem "cumprimentados" pelos pais (que tinham sido chamados à escola) com bofetadas antes de qualquer palavra. Tive colegas cujo ritmo de aprendizagem era mais lento e, por isso, condicionavam o ritmo de progressão de toda a turma. Tive colegas repetentes, de todas as cores e tamanhos e origens. Tive turmas maioritariamente masculinas, cheias de motoqueiros armados em bad boys. Tive de lidar sozinha com tentativas (goradas) de bullying. Tive de confrontar uma professora demasiado permissiva com o boicote diário que ela permitia a quem queria aprender. Tive colegas com deficiências físicas, e outros que eram atletas de primeiríssimo nível, tive colegas ricos, outros muito pobres, tive colegas católicos, outros muçulmanos, outros agnósticos, outros ateus. Já na faculdade, convivi com colegas que tinham feito o secundário em liceus privados e muito caros, e com quem andava quilómetros diariamente para chegar à sua escola secundária algures no distrito da Guarda. Uns chegavam de descapotável, outros de transportes públicos, outros de cadeira de rodas empurrada por familiares. Havia militares, pessoal a fazer segunda licenciatura e que já trabalhava, um velhote que andava por lá a passar a reforma, uns que tinham ido parar ao curso errado na esperança de obter equivalências e mudar para o curso que realmente queriam.

 

 

Toda esta diversidade compôs o melhor ambiente de ensino que eu poderia desejar, por ser tão representativo do mundo real. É que a escola deve ensinar muito mais do que o que vem escrito nos livros. Foi no ensino público que aprendi a tolerar e respeitar as diferenças, todas as diferenças. Descobri que podemos encontrar amigos e aliados em quem menos esperamos. Percebi que o que era garantido na minha casa (seja em termos económicos ou disciplinares até coisas tão básicas como normas de higiene) não o era na casa do meu colega do lado. Aprendi a não ter vergonha de ser boa aluna e a desenrascar-me por mim própria mesmo se os professores falhassem, se chovesse em cima dos livros e o diabo a sete. Ganhei resiliência. Sobrevivi a dias de doze horas de aulas sem intervalos e a dias de "furos" de oito horas. Aprendi a lidar bem com mudanças bruscas e novos desafios, enfrentei todas as reformas educativas em cada ano inicial da coisa, qual cobaia. Criei uma carapaça quase imbatível de resistência à frustração. Aprendi que os dogmas só o são até serem substituídos. Aprendi que a vocação de cada um é tudo, mas pode não ser suficiente. Aprendi que a vida não é justa, nem tem garantias, e que o caminho mais fácil/previsível/regular normalmente não tem piada nenhuma. Aprendi que se não for cada um de nós a lutar pelos nossos direitos e pelos nossos objectivos, ninguém o fará por nós. Até aprendi a estudar, aprendi a aprender e, o mais útil de tudo, aprendi a ser quem quero ser.

 

E nem foi necessário ter aulas de religião, golfe, esgrima, equitação ou rapel!

 

 

 

Poderão dizer-me que a minha visão é toldada por ser parcial e não conhecer o reverso da moeda, mimimimi. Só que conheço. Pese embora a minha única experiência com o ensino privado tenha sido na perspectiva de docência, infelizmente pude confirmar que a maior parte das minhas ideias feitas só pecavam pela parcimónia. O ensino privado é, antes de mais, um negócio, e visa principalmente obter o máximo de lucro. Se o ensino é de qualidade, se a oferta lectiva é adequada às necessidades da sociedade e do mercado de emprego, ou se é garantido o bem-estar dos alunos são pormenores - ou pelo menos assim parece! Não querendo extrapolar do particular para o geral, posso dar como termo de comparação os conteúdos programáticos das disciplinas que leccionei e que eram, em dois semestres da universidade privada, inferiores em quantidade e detalhe àquilo que aprendi em apenas um semestre enquanto aluna numa universidade pública. Quanto a condições, eram fracas (equipamento manifestamente insuficiente e horários anti-pedagógicos, por exemplo, até alguns casos extremos de não haver cadeiras suficientes nas salas de aula para todos os alunos), mas nem foi isso que me chocou mais. O que me deixou realmente espantada (e triste) foi o facto dos meus alunos - de cursos com propinas mensais entre os seiscentos e os mais de mil euros - não reivindicarem mais e melhor do que aquilo que lhes era apresentado. Perguntei-lhes porque não reclamavam e as respostas oscilaram entre ombros encolhidos e um tom resignado de "não vale a pena"... 

 

Nas "piores" das escolas públicas não é raro encontrar alunos brilhantes. Mas, ao contrário do que eu pensava há alguns anos, no ensino privado nem todos os alunos são limitados. Pese embora não me tenha cruzado no ensino superior privado com nenhum aluno excepcional, tive alguns bons alunos, muito capazes e inteligentes. Mas talvez por serem, de alguma forma, privilegiados (não é quem quer que pode dispender mensalmente de 600 a 1000 e tal euros para pagar propinas, é só quem pode!), não lhes ocorria exigir o mais essencial do que quantias tão avultadas deviam servir para pagar.

 

Quando era pequena, adorava ir ao zoo, e tudo o que envolvesse estar perto de animais. Dar pão aos patos no pequeno lago do jardim, observar formigas e lagartixas também. Há várias fotos de mim, no zoo, agarrada às redes, sem ser perceber bem se preferiria que os bichos estivessem livres ou que eu estivesse do lado de lá. Creio que me era indiferente, eu queria era estar com eles, comunicar com eles. Recordo-me de ter a sensação de não me sentir diferente destes animais e achar que comunicava de forma algo telepática com eles. Na verdade, ainda acho um pouco.

 

O que vem nos livros de conservação da natureza e biodiversidade, e com o que eu concordo, é que os zoos têm uma importantíssima missão de educação e sensibilização. É verdade que não se gosta daquilo que não se conhece, e do que não se gosta não há vontade de preservar. Toda a gente está sensibilizada para o perigo que correm os pandas e o seu habitat porque os pandas são giros, são fofos, são engraçados. (As espécies menos fofas também precisam de atenção e é bem mais difícil captar atenções e mobilizar meios de estivemos a falar de répteis com ar feroz ou de peixes feiosos.) Acrescento ainda o papel que os zoos tem em múltiplos programas de preservação de espécies em risco, também pelo aspecto da reprodução em cativeiro, e programas de salvamento e mesmo de reintrodução de animais no seu habitat natural. Tudo certo. Há todo um trabalho muito bom e muito meritório de todo o meu respeito e veneração, mesmo.

 

Mas depois há a realidade. Eu pensava que aguentava e que tinha saudades de ir a um zoo, toda a minha racionalidade alerta confirmava cada palavra que repeti para conseguir convencer o homem, que odeia zoos tanto quanto odeia touradas e animais no circo (como eu), metendo tudo no mesmo saco. Eu tinha de ver os pandas no Zoo de Pequim, tinha mesmo. Lá fomos. O homem sob protesto. Ainda por cima tão barato. E foi duro. Muito duro. Não que as condições fossem más, para zoo, que não são. Mas não só não matei saudades de zoo como até acho que enquanto me lembrar daquele urso não volto a pôr os pés num zoo.

 

Sacana do urso, tão longe da sua casa (ainda que nunca tenha conhecido outra), com aqueles olhos a falarem comigo, a pôr-de de pé quando viu o homem, com ar de súplica, como quem pede ajuda ou só conversa. Os acrílicos entre nós. Outros ursos a vaguear. Os olhos daquele urso a perguntarem "porquê". Os meus olhos desfeitos em sal, os olhos dele a soluçarem. Mesmo a recordação daqueles minutos me dói com o peso de todo o mal que fazemos ao planeta, a nós.

 

Não mais, por favor. Não mais.

Eu era (e sou) de esquerda (esquerda a sério), e a favor de uma PGA no acesso ao ensino superior. Não nos moldes da famigerada PGA tal como existia, limitada a questões de Português e História, mas uma PGA com questões essenciais de Português, Matemática, Ciências da Vida, História e actualidade. Considerei uma PGA útil e necessária enquanto aluna do Ensino Secundário, enquanto aluna do ensino superior e enquanto professora do ensino superior. Não acho (sem grandes certezas, porque estou distante da realidade do ensino básico) que os exames nacionais do 4º ano sejam úteis e muito menos necessários, mas acho que a avaliação é necessária e tem de ser encarada com toda a naturalidade.

 

A propóstito deste post do sempre acutilante País do Burro.

A política do medo instalou-se por todo o lado. A comunicação social tornou-se ainda mais perversa e vale tudo para vender, vale o título gerador de conflito e de pânico, vale adiantar factos não confirmados, vale desinformar em vez do que devia ser a sua missão primeira, o oposto disso.
Vale a mentira.

A mentira é sempre a pior política, a meu ver. A nível individual, seja nas relações pessoais ou laborais, sigo desde sempre a minha regra da verdade acima de tudo. Traz dissabores, sim. É difícil de gerir, por vezes. Tem de se usar de diplomacia extra para dizer algumas verdades mais penosas (de dizer ou de ouvir). Mas vale a pena, porque não há nada que magoe mais do que a mentira. E é uma ofensa, seja por colocar aquele a quem é dita a mentira num patamar intelectual ou emocional inferior, no mínimo fraco. Ou acham que nunca irás descobrir a mentira, ou que não és capaz de lidar bem com a verdade.

A mentira é, ponto assente e repetidamente comprovado, o modo de viver das classes políticas mais fortes, porque é através dela que chegam ao poder. A mentira vale os votos dos mais distraídos, crédulos, ignorantes, interesseiros e cínicos. O interesse comum e público é cilindrado em prol de alguns interesses pessoais e materiais. É por esse motivo que a educação e a ciência são inimigos do despotismo encapotado, esse sim temível e mortífero e devastador.

Como é que nos habituámos a viver assim, a ser (des)governados assim, e sem muito fazer para trazer a verdade ao de cima?! Vivemos realmente num mundo fabricado, numa matriz para consumo imediato e superficial.

 

Até quando iremos tolerar esta deriva no nevoeiro?

Tudo. Mesmo (e sobretudo) as crenças e ideias que se incutem às criancinhas indefesas.

 

Os manifestantes são todos maus e violentos, os polícias são todos bons e defendem os bons. Tens de ser bonzinho, não ir a manifestações (queres envergonhar os teus pais?! olha que ainda vais preso!), se te calhar em estar no meio de uma das muitas cargas policiais injustificadas que este país de brandos costumes vê passar na TV, come e cala-te.

 

E já agora, fica sabendo que as pessoas más e perigosas são as sujas e rotas, as pessoas mesmo mesmo boas usam gravata ou saltos altos e aparecem na televisão. Para seres bom tens de cumprir ordens e fazer o que te dizem e o que é esperado de ti, sem perguntas.

 

Tudo é política. E muita desta é podre e nauseabunda.

 

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