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Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

Ventania

Na margem certa da vida, a esquerda.

origem

Aguarda pacientemente no escuro, observa com cuidados cada detalhe, ao longe, em silêncio, sem se fazer notar, de mãos nos bolsos a forçar uma atitude blasé. Com vontade de aventura, sim, mas sem grande certeza de querer arriscar. Hesita e calcula, calcula e hesita. 
Gosta de partilhar a melancolia mas odeia ter de a explicar. Tem uma voz possante que ocupa todos os espaços, tem uma presença vincada que quase o mascara. O discurso tem falhas, sobretudo nas costuras, frouxas por serem impermeáveis às razões alheias. A postura de macho alfa leva ao engano, ele aprecia a protecção que lhe dá de quem o julga capaz de tudo. Preso numa vida que o esmaga e sufoca, cheia de horários, frustrações, contas e obrigações, tudo o que queria era algum silêncio, paz, tempo para se esquecer e leveza para encontrar a alegria do seu sorriso espelhado no de um filho. Não cede nunca, resiste a tudo, e pensa que é isso que o faz parecer invencível. Atrás de cada porta que fecha, por força do orgulho desmedido em continuar só, deixa um amigo vazio, sem mais nada para dar. Isolado no alto do seu castelo de distâncias caladas, grita e esperneia Baltasar. Se é som ou silêncio que fala, não importa, que as muralhas em volta são blindadas e dentro delas só circula o ar. É um gigante pateta, recto e honesto, triste por estar só, mas não deixa vivalma se aproximar. Quer que lhe leiam nos olhos as histórias difíceis e a solidão, que se confirme que é raro e especial, mas é profissional das fugas, não pára quieto no mesmo lugar. É um menino pequeno, carente de colo e de cumplicidades, brinca com frases e corações, morde e pisca o olho, mas sempre sem se dar. Gostava de encostar a cara a alguém que não o julgue e só descansar. Gostava de receber beijos molhados, não antecipados, abraços apertados. Gostava de não ser um maneta emocional, de se deixar erguer quando outros braços o tentam puxar. Queria ser outro, noutro lugar. 

[Podia ensinar-te a sorrir, se desaprendesses a calar.]

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No outro dia passei com o gajo em frente a um alfarrabista, já fechado. Como ele costuma reclamar que é muito difícil oferecer-me prendas, que eu sou muito esquisita (mentira, tenho é gostos distintos da maioria), e ainda por cima temos uma longa discussão em curso desde que nos conhecemos sobre o facto de eu preferir quase sempre literatura e ele preferir quase sempre não literatura, sugeri dois livros que me fariam feliz como presente de aniversário. De valor simbólico, dois livros não literários que têm tudo a ver comigo. Sugeri que tirasse foto para não se esquecer.

Faço anos daqui a mais ou menos dois meses. Quem aposta comigo que, mesmo com este post, ele vai esquecer-se ou pelo menos trocar-se e não traz os livros certos?

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O meu homem tem um problema grave. Pensa que me chamo Google. Todos os dias - repito, toooodos os dias - dispara perguntas aleatórias, sobre qualquer tema, desde ciência a culinária, a qualquer momento, e espera pela minha resposta. Eu até gosto, confesso, de perceber o que fervilha naquela cabeça a mil à hora, por detrás daqueles olhos cor-de-mel. Depois irrito-me porque antes de terminar uma resposta já ele está a fazer outra pergunta. Mas o que me irrita mais é quando lhe digo que não sei, porque ele faz-se de indignado a pensar que eu não estou é com pachorra para lhe responder. "Como não sabes?! Sabes sim senhora! Tens de saber estas coisas!"


Da mesma forma que há pessoas que pensam que todos os advogados têm de saber todo o código civil/do trabalho/penal de cor, ou que todos os físicos têm de saber todas as teorias da física na ponta da língua, o meu homem acha que eu tenho de saber tudo sobre quase tudo, qual poço sem fundo. Talvez assim ele perceba: "Não sei, pesquisa na Internet! Eu não sou o teu Google!"


Eu - Podes pôr a mesa, sff?


O homem bufa, enfadado, e leva 2 individuais, 2 garfos e 2 facas para cima da mesa.


Eu - Mas vamos comer sopa.


Ele - "Ah, esqueci-me das colheres."


Eu - E os copos?


Ele - "Ah, esqueci-me."


Eu - Não te esqueças dos guardanapos!


Bufa mais um pouco e atira com os guardanapos.


Eu - O que é que vamos beber?


Ele - Grrrrrrrrrrr!


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(Acho que ele tem uma secreta estratégia de fazer asneiras ou dar tiros ao lado nas tarefas domésticas, com esperança que eu desista. Azar: quanto mais disparates fizer, mais prova que é preciso insistir para aprender a fazer bem. Dá muito trabalho educar um marido que não foi devidamente ensinado, mas vai chegar o dia em que não vai ser preciso ser eu a dizer e a pedir que faça isto ou aquilo - aquela conversa do marido "ajudar" em casa aqui não pega, as tarefas são dos dois em igual medida, somos sócios igualitários. )

O meu homem tem tanta queda para a cozinha como o Jorge Jesus para a Geografia.


Eu sou casmurra e defensora acérrima da divisão equitativa das tarefas domésticas, por isso de cada vez que estou a cozinhar chamo o babe para me "ajudar" e fazer outras coisas que não sejam cozinhar, como lavar a loiça ou arrumar alguma coisa.


Estava de volta do fogão a preparar o almoço e peço-lhe que me tire do armário a varinha mágica. O que é que ele pôs em cima da mesa?



Isto. A batedeira.

Uma moira pessoa (eu) está fora, em trabalho. Uma pessoa liga para o esposo, cheia de saudadinhas e mimo para dar - e receber. O estronço esposo não ouve. Nem à primeira, nem à segunda, nem à terceira. Acorda para a vida quando a pessoa está a jantar com colega de trabalho, fala-se sem grandes intimidades nem cutxi cutxi porque colega está presente (e porque bater no Cavaco é a prioridade). Final de conversa:


Pessoa (eu) - "A gente já fala mais, quando chegar ao hotel ligo-te."


Estronço esposo - "Ah, eu a seguir vou ver os zombies, portanto não me incomodes."



(Ainda ponderei alterar-lhe a password do WiFi, mas sou um coração mole...)

 

    • Quem fala de política sem medo de divergir da maioria.

 

    • Quem é fiel aos seus princípios e defende até ao fim aquilo em que acredita.

 

    • Quem trata bem os animais.

 

    • Quem sorri quando fala e ouve falar de viagens boas.

 

    • Quem leu pelo menos dez vezes mais livros do que teve namoros.

 

    • Homem com barba.



Che Guevara sexy barba comunismo política

 

 

 

Disclaimer: as minhas definições, a vocês (os três) que me lêem, estejam à vontade para discordar.

Quero um homem que não tenha medo. Que não tenha medo de se dar, de arriscar, de ser magoado, das consequências e dos erros. Quero um Homem com H grande, mais que um miúdo. Quero que não tenha pudores em entregar-se às emoções, que não seja mesquinho e não considere que abandonar uma ideia é negar-se a si próprio. Quero um homem que me acorde a meio da noite com beijos de desejo e que se enebrie no perfume dos meus cabelos. Quero um homem que não tenha receio de falhar e que queira sempre mais e melhor. Quero um homem que me cante à janela e me escreva poemas para me conquistar, que me diga sempre toda a verdade que lhe dita o coração e a alma. Quero um homem que saiba ler os meus olhos mas não se assuste com as minhas palavras. Quero que tenha palavras iguais às minhas e as coloque todas a uso. Quero um homem que me fotografe à socapa e me deixe bilhetes pela casa. Quero um homem artista, que encontre beleza onde os outros não a vislumbram. Quero um homem muito inteligente, que resolva equações de cabeça e que me dê enigmas para decifrar. Quero um homem poeta, bem resolvido consigo e com o passado, ansioso de abrir as asas e voar. Quero uma companhia para tardes de cinema, que goste de pipocas salgadas e de mãos dadas no escuro. Quero um homem que procure as minhas mãos com as dele enquanto dorme. E que goste de mãos dadas de dia, de abraços e beijos no meio da estrada, que se apaixone de cada vez que eu lhe salte para as cavalitas ou faça um ataque de cócegas. Quero um companheiro para todas as viagens, que oiça música nos carris de ferro e com quem possa partilhar silêncios. Quero um homem despreocupado, independente e rebelde, quero um homem com mau feitio, opinativo e determinado. Quero um homem sem fé mas com esperança, que veja nas improbabilidades oportunidades de magia. Quero um homem que adore perder-se em mercados e nos aromas das frutas frescas, que ande descalço na relva e me escreva o nome na areia. Quero um homem culto e honesto, bondoso e sensível. Quero um homem que cheire a lavado e que se arrepie quando lhe roçar os dentes na barba. Quero que me olhe com uma expressão de adoração, paixão, tesão. Quero um homem que saiba beijar como eu gosto, com doçuras, que saiba tocar-me a pele com a ponta dos dedos. Quero um homem que não me faça promessas, que me descubra tesouros e me abrace com força. Quero que partilhe o sono, os sonhos e pesadelos comigo. Quero um homem para rir em gargalhadas inconvenientes e com quem chorar a tristeza. Quero um homem sem dúvidas e que veja para lá do óbvio. Quero um homem educado e gentil, instruído e criativo. Quero um homem que me surpreenda. Que me vende os olhos e que me dê a provar à boca a comida dele. Quero um homem que me proteja sempre com a verdade. Quero um homem que me respeite, que me coloque acima de todas as coisas e que tenha orgulho em mim. Quero um homem com estrelas no fundo dos olhos. Quero que me dê flores só quando o momento não seja de comemoração, quero que se esqueça das datas mas que recorde todos os momentos. Quero um homem que nunca fique comigo contrariado. Quero que compreenda que às vezes, preciso de estar sem ele e que não o amo menos por isso. Quero um homem fiel a mim e sobetudo, a si próprio. Quero um homem que não diga “talvez” se sabe que a resposta é “não”. Quero um homem despenteado, das ideias. Quero um homem sem planos para amanhã, um companheiro de aventuras e traquinices. Quero um homem que me ame desalmadamente, com toda a alma, até que a alma doa se não me tem.

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