As paredes meias são intransponíveis, frias, espessas, rudes. Gritam distâncias, cilindram qualquer aproximação luminosa. É difícil, é longe, não se consegue fazer ouvir do outro lado do muro. São franjas de alegrias francas penduradas nas molduras tortas, lá longe no tempo de fogueiras e sorrisos, de encontros e beijos furtivos, são mágoas penduradas nas esquinas, a lascar a tinta, a fazer sombra.
E é o castigo de ter tão dentro quem está longe e os dedos quase se aquecerem, entrelaçados nos sonhos e nos dilúvios da alma a desabar. Os abraços semeados nas entrelinhas, que fogem, com as letras todas menos algumas.
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Quando nos dias maus, de abandono, de incertezas, de quebras, te surge uma nau de tinto alentejano por esse rio acima, com a promessa de céus estrelados e abraços doces, enxugas a lágrima teimosa e bebes um golo. Brindas às incertezas que podem ser surpresas muito boas e segues em frente, com mais uns epítetos na bagagem do quase nada que és.
Por este rio acima Deixando para trás A côncava funda Da casa do fumo Cheguei perto do sonho Flutuando nas águas Dos rios dos céus Escorre o gengibre e o mel Sedas porcelanas Pimenta e canela Recebendo ofertas De músicas suaves Em nossas orelhas leve como o ar A terra a navegar Meu bem como eu vou Por este rio acima
Por este rio acima Os barcos vão pintados De muitas pinturas Descrevem varandas E os cabelos de Inês Desenham memórias Ao longo da água Bosques enfeitiçados Soutos laranjeiras Campinas de trigo Amores repartidos Afagam as dores Quando são sentidos Monstros adormecidos Na esfera do fogo Como nasce a paz Por este rio acima
Meu sonho Quanto eu te quero Eu nem sei Eu nem sei Fica um bocadinho mais Que eu também Que eu também Meu bem
Por este rio acima Isto que é de uns Também é de outros Não é mais nem menos Nascidos foram todos Do suor da fêmea Do calor do macho Aquilo que uns tratam Não hão-de tratar Outros de outra coisa Pois o que vende o fresco Não vende o salgado Nem também o seco Na terra em harmonia Perfeita e suave Das margens do rio Por este rio acima
Meu sonho Quanto eu te quero Eu nem sei Eu nem sei Fica um bocadinho mais Que eu também Que eu também Meu bem
Por este rio acima Deixando para trás A côncava funda Da casa do fumo Cheguei perto do sonho Flutuando nas águas Dos rios dos céus Escorre o gengibre e o mel Sedas porcelanas Pimenta e canela Recebendo ofertas De músicas suaves Em nossas orelhas Leve como o ar A terra a navegar Meu bem como eu vou Por este rio acima
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Hoje deu-me uma enorme vontade de chorar, não me perguntes porquê. Alguma coisa estará a desmoronar, talvez. Mudei a rota. Enchi o peito de valentia destilada e marchei até ao nosso banco. Chamei nomes feios a quem lá estava, só porque sim, ou então porque queria mesmo era ver a memória de nós dois, em deslumbramento um com o outro, a deixar fugir beijos tão honestos, de mãos dadas e conversa líquida, eu colada aos teus olhos e à tua barba, tu agarrado a uma fantasia em que eu era protagonista. Tenho vontade de chorar. Fomos poesia. Nunca mais nos vou ver assim, tão puros e novos a estrear, com aquele brilho nos olhos de quem acabou de ganhar o euromilhões mas em melhor, com o tempo a parar à nossa volta, como nos filmes, com a banda sonora a adormecer-nos os sonhos. Como sei que sonhaste, porque eu sonhei também, tantas vezes. Tudo mudou. Os teus olhos não se deixam ver por mim e eu não choro, mesmo sem saber o que me quer este vazio pegajoso que persiste.
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Quem, digam-me!, QUEM é que chora, ainda por cima mais que uma vez, ainda por cima sempre em público, com "A Viagem do Elefante", do Saramago?...
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Não concordo nada. Chorar resolve, nem que seja pelo cansaço, coisas importantes dentro de nós. Ou pelo menos ajuda bastante. Não sendo a melhor das soluções, na falta dum abraço e dum chocolate quente, é a alternativa que se apresenta. Chorar as saudades dry.(Pois, só funciona em bilingue.) É o que faz, literalmente, chorar baba e ranho (pelo menos a mim). Uma torneira de mar salgado em cada ducto lacrimal. Chorar raiva e injustiça. Com a face quente e vermelha e um nó na garganta que sufoca e parece que quer esmagar o peito oprimido e as veias do pescoço a gritarem mais alto. Chorar tristeza, é o que custa mais. Lágrimas lentas, espessas, a correrem com toda a indolência pela cara abaixo, em silêncio, sem se tocarem, até tornarem ao canto da boca e se reciclarem no ciclo da melancolia. Da mesma composição das lágrimas de solidão, ou não fosse a solidão filha da tristeza (ou será vice-versa?).
Não chegou a haver tempo para ter saudades das lágrimas, que se elas andarem avessas uma ou outra semana parece apenas que contemplam umas breves férias, merecidas, por quem está no activo todos os outros dias do ano.
Chorar ausências e o que nunca teve uma oportunidade de ser criado, como um aborto antes da inseminação. Chorar uma última vez (...), como num beijo de despedida, e secar os olhos e untar com camadas espessas de ternura cicatrizante o coração que bate, já bate, e como bate (!), e por tanto e tão forte bater arrepanha as cicatrizes mal curadas.
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Durante duas semanas não chorei. Fui largando camadas e camadas de pele, de mágoas, de tristezas. Fui abrindo lugar a novas emoções, a descobertas, a bocadinhos de mim que andavam esquecidos num qualquer labirinto escuro aonde não pertenço, que eu sou da Luz e da Vida, do Ar e da Música. Mas as lágrimas têm de ter lugar. Não podem ficar entaladas na garganta, a ressequir as emoções. Saem, como as palavras, cada vez mais. Sem pressa nem peso, saem quando é tempo, quando é verdade. Saem por tudo e por nada, que as emoções se transpiram em mim, por todos os poros. É por isso que a armadura de ferro é obrigatória.
Porque tornei a chorar por ele, a minha saudade, num abraço imaginado.
"Sorriso, diz-me aqui o dicionário, é o acto de sorrir. E sorrir é rir sem fazer ruído e executando contracção muscular da boca e dos olhos.
O sorriso, meus amigos, é muito mais do que estas pobres definições, e eu pasmo ao imaginar o autor do dicionário no acto de escrever o seu verbete, assim a frio, como se nunca tivesse sorrido na vida. Por aqui se vê até que ponto o que as pessoas fazem pode diferir do que dizem. Caio em completo devaneio e ponho-me a sonhar um dicionário que desse precisamente, exactamente, o sentido das palavras e transformasse em fio-de-prumo a rede em que, na prática de todos os dias, elas nos envolvem.
Não há dois sorrisos iguais. Temos o sorriso de troça, o sorriso superior e o seu contrário humilde, o de ternura, o de cepticismo, o amargo e o irónico, o sorriso de esperança, o de condescendência, o deslumbrado, o de embaraço, e (por que não?) o de quem morre. E há muitos mais. Mas nenhum deles é o Sorriso.
O Sorriso (este, com maiúsculas) vem sempre de longe. É a manifestação de uma sabedoria profunda, não tem nada que ver com as contracções musculares e não cabe numa definição de dicionário. Principia por um leve mover de rosto, às vezes hesitante, por um frémito interior que nasce nas mais secretas camadas do ser. Se move músculos é porque não tem outra maneira de exprimir-se. Mas não terá? Não conhecemos nós sorrisos que são rápidos clarões, como esse brilho súbito e inexplicável que soltam os peixes nas águas fundas? Quando a luz do sol passa sobre os campos ao sabor do vento e da nuvem, que foi que na terra se moveu? E contudo era um sorriso."
José Saramago
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Eu sei que é lamechas... Tenho andado assim, envolta num véu de sentimentalismo. Capaz de ir ali para os lados do Lumiar* e fazer uma serenata ao luar, até que todas as pedrinhas da calçada me tentem igualar nos prantos solitários e disparatados. (Mas a despesa em vidros seria incomportável.)
I mean every word...
(Versão da Leona Lewis, no X factor, como qualquer outra miúda a expôr o que lhe vai na alma.)
Doer no peito cada dor tua, mesmo as que me magoam mais a mim
Sentir que conhecer-te foi das maiores dádivas que o Universo me podia ter dado
Rever o teu sorriso nos poemas do Eugénio
Guardar cada abraço como um tesouro
Colocar todos os males do mundo em “pause” quando a tua mão procura a minha
Partilhar aventuras contigo que mais ninguém partilharia
O código do meu cadeado ser a tua data de nascimento
Os lírios, tristes, de cada beijo
A ternura com que te ajeito o cabelo
Dar-te impulsos para voar em vez de te querer prender
Acordar a sorrir porque estavas a meu lado
Desde o dia em que te conheci, seres um “brilhozinho nos olhos”
Ter-te dito, com o mesmo espanto com que o assumi, quando descobri que a Paixão por ti havia marcado a minha existência
Passares a mão na minha anca e dizeres “assim deixas-me maluco”
Sonhar que o inimaginável é possível, contigo
Atirar-me dum avião contigo
Chorar à tua frente, chorar contigo e por ti
Despir-me à tua frente
Ser-te sempre honesta e verdadeira
Equacionar-te para pai dos meus filhos
O inegável carinho
Partilhar a minha escova de dentes contigo
Ter pedido que te dessem a ti a oportunidade que também te pedi
Ser acordada pelo teu desejo
Fazer um test-drive contigo
Ver filmes indianos contigo
Fazer Amor contigo
Falar contigo de tudo, como se fosse só comigo
Dar beijinhos nas tuas feridas para que sarem mais depressa
Massajar-te os pés
Ter escrito sobre ti num dos jornais mais lidos no país
Adorar o teu rabo, as tuas bochechas e as rugas nos cantos dos olhos
Pedir-te, de coração aberto, uma oportunidade de provar o quão felizes podemos ser juntos
Comermos gelados juntos em três continentes diferentes
Dedicar-te uma música na rádio
Fazer uma aposta no euromilhões por ti, e a chave ser premiada
Tu gostas de doces, eu sou doce e chamo-te docinho
Ter sido tomada por tua namorada ou esposa mais que algumas vezes
Gostarmos das mesmas coisas
Termos o mesmo sentido de humor
Apoiares-me em todas as aventuras tresloucadas, e vice-versa
Defender-te quando um amigo tem vontade de te partir a boca para me defender a mim
Terem-nos desejado "a happy married life"
Dares-me à boca a tua comida para eu provar
Ser a primeira pessoa a quem recorres quando precisas dum favor ou dum ombro
Vermos a Via Láctea e estrelas cadentes de mãos dadas, deitados nas dunas
Amar-te incondicionalmente até que o Sol deixe de nascer
Motivos para te esquecer, sei-os de cor. São mais que muitos. Repito-os todos os dias, sempre que o pensamento resvala para ti. Percorro na memória tudo o que me disseste, cada uma das palavras mais cruéis que se pode ouvir. E oiço a voz da razão, da lógica, de cada amigo que me ampara e aconselha. E sei que consigo, nunca duvidei. Não são as forças que me falham, não é a razão, nem a ausência de esperança, que essa vais destruindo até só faltar um último pedacinho.
Culpar-te, por insistires, por não me deixares morrer em paz na tua vida, por me procurares, depois de eu dizer não mil vezes. Culpar-te, por seres assim, surreal, ideal, perturbado, como eu gosto. Maldizer o dia em que ouvi o teu nome e cada um dos mil acasos que te trouxeram a mim. Não adianta e eu sei que não. Hoje, não. Por muito que o amor seja o sentimento mais forte do mundo, por muito que eu desse tudo, tudo, por ti. Não posso convencer-te que me amas. Nem quero.
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Há dias em que acordo triste. Esgueiro-me aos pensamentos que sei que ardem, por entre rotinas e obrigações. E noutros dias, em que acordo ainda mais triste, falham-me as vontades, permito o alívio duma ou outra lágrima mais longa, por baixo dos óculos de sol, no meio de tanta gente, ninguém vê, nem ninguém se importaria se visse. É a tristeza assim concentrada, que liberto quando a pressão quer fazer rebentar o peito, que me vai permitindo alguma sanidade, mesmo um ocasional e pouco motivado sorriso. Ainda bem que aprendi a chorar.
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Não tenho tempo para nada! Tanto para fazer, entre um trabalho e o outro, e eu e a casa... Não sobra tempo. E tenho escrito tanto... Mas não posso, não tenho tempo. Só que para escrever tenho de ter, é uma necessidade primária. Curioso, quando era feliz não tinha tempo para escrever... Não sei se escrever apazigúa ou alimenta as angústias. Mas parece-me que escrever e chorar são duas variáveis dependentes duma mesma constante.