A esquerda continua a insistir em marcar as suas diferenças em vez de se concentrar nas semelhanças, e assim continua a perder eleições e votos. Carvalho da Silva teria sido um candidato unificador, com provas dadas, conhecido por todos e independente (como fazia falta que fosse).
Eu continuo a estar num sítio muito específico, com a certeza da ideologia comunista, e com a frieza de discordar em vários pontos e a desfaçatez - dirão - de admirar alguns outros pontos nos "adversários".
Por muito que a comunicação social o deseje, BE e CDU não são adversários naturais. São distintos, sim, mas na maior parte dos aspectos importantes, são idênticos e complementares. E espantem-se, nenhum dos dois é dono da razão. O BE defende, e bem, o fim das touradas, ao passo que a CDU até é a favor do regime de excepção em relação aos "touros de morte" em Barrancos, a bem duma "tradição" bárbara e cruel. A CDU é, e bem, contra o Acordo Ortográfico que o Bloco defende (sendo que a Marisa Matias discorda do seu partido, o que lhe vale pontos adicionais no meu respeito e consideração). Mas o Bloco defende a despenalização das drogas leves e a CDU nem sequer faz distinção entre drogas leves e pesadas. Ambos advogam os direitos igualitários entre géneros, mas se no Bloco a liderança e as figuras fortes são (grandes!) mulheres, ė na bancada do PCP que a paridade é (muito) mais sentida.
A piadola de Jerónimo de Sousa não tinha Marisa Matias como alvo, estou quase certa (pareceu-me que os alvos seriam os populistas Marcelo e Vitorino). Tenho Jerónimo como pessoa de bem e exemplar no trato para com os outros; uma atitude misógina deste calibre não se coaduna com a pessoa e muito menos com o líder político. Se a infeliz frase foi mesmo dita com a intenção de minimizar politicamente uma mulher e uma força política que têm mostrado o quanto merecem o respeito do povo português, é triste, grave e lamentável. Convinha o esclarecimento, já agora.
O PCP peca, e perde, pela falta de agilidade na comunicação, onde o BE é exímio e acutilante. Se o PCP quer acompanhar o ritmo frenético do Séc. XXI, tem de sair do Avante! para o mundo, tem de deixar-se contaminar pelo fulgor da juventude, tem de marcar uma presença forte e coerente nas redes sociais, tem de dotar o discurso de maior capacidade de improviso, de subjectividade (ou seja, autenticidade). Bater sempre na tecla da "política patriótica e de esquerda" e afins é um erro, é dar argumentos a quem etiqueta tudo como "a cassete" e nem se dá ao trabalho de escutar o seu significado.
Do mesmo modo (e aqui Edgar Silva é o último exemplo flagrante), não pode existir hesitação nem respostas enigmáticas a questões muito objectivas. Se há democracia na Coreia do Norte, a liberdade de expressão em Angola, etc. e tal. Há que agarrar o toiro pelos cornos e assumir, com toda a frontalidade, onde os outros projectos comunistas falharam; há que assumir deliberadamente que o projecto do PCP não passa pelos mesmos moldes e explicar, com factos, argumentos e propostas, qual é a proposta do PCP para Portugal.
Assumir humildemente a derrota nas presidenciais seria um bom começo num virar de página. A substituição da lideranla de Jerónimo, como tem vindo a ser referida por aí, não tem resposta em Edgar Silva (que, apesar de tudo, foi um dos melhores candidatos de sempre do PCP). Ouçam o que eu digo: Bernardino Soares.
A primeira coisa que Martelo faz quando se dirige ao país pela primeira vez após as eleições presidenciais: "Shhhhhhhhh!"
Venham os próximos 5 anos disto.
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9,7 milhões de eleitores nos cadernos eleitorais. Não sabia que agora as crianças já votavam a partir dos 2 anos.
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Os resultados eleitorais de Vitorino Silva vêm provar que o Manuel João Vieira tinha todas as condições de ir à 2ª volta com Martelo.
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A esquerda apregoa "o povo unido jamais será vencido" e depois apresenta múltiplos candidatos para fazer frente ao único candidato da direita. A vitória de Martelo prova que "a união faz a força".
Como não olhar para os partidos de onde vêm, onde estão, que os apoia (assumida ou discretamente), para observar antes a pessoa?!
Ao contrário do que parece a muito boa gente, não é (só) em pessoas que votamos, nem para as presidenciais e muito menos para legislativas e autárquicas.
Primeiro, não conhecemos, regra geral, as pessoas por detrás dos candidatos. Não sabemos em primeira mão dos seus afectos, dos seus humores, se preferem tinto ou branco, ou se têm mau hálito. Nem sabemos, nem temos nada que saber, nem isso importa minimamente para o caso.
Em segundo lugar, gostar ou simpatizar com uma figura pública, com a "persona", sem tomar em conta as ideias políticas e ideológicas, não garante qualquer tipo de confiança no desempenho de funções com competência e honestidade, muito menos é bom presságio de que se venha a concordar com as posições que o candidato venha a tomar, futuramente.
Por mero acaso, eu até conheço uma pessoa que é candidata à presidência. Não conheço intimamente, mas é uma pessoa que estimo, de quem tenho a melhor das impressões, que é, tanto quanto fui apurando ao longo do tempo, uma pessoa honestíssima e exemplar a muitos níveis, sobretudo o humano. Ideologicamente, até nos situamos a pouca distância, embora não tenhamos posições idênticas. Mas não é nesta pessoa que vou votar, e isso nem sequer me cruzou o pensamento. Porquê? Porque há candidatos que me representam melhor e que eu considero mais aptos para a função.
Se os apoios ou aproximações partidárias contam para esta decisão? Obviamente! Não tem qualquer fundamento ajudar para eleger uma pessoa cujo papel é o mais importante na democracia se não nos revemos no seu discurso, ou se criticamos as suas decisões ou ausência delas. Quero na presidência um candidato em quem confie para defender os ideais que, na minha óptica, são os mais correctos, os mais justos. Quero na presidência alguém que zele pelo bom funcionamento da democracia no meu país, que faça respeitar a Constituição, que chame à responsabilidade os governos, os protagonistas da economia e da sociedade civil. Não posso ignorar o seu percurso político, aquilo que fez e disse, aquilo em que acredita.
Uma destas manhãs dizia uma colega (daquelas pessoas que gostam muito de dizer coisas, muitas vezes contraditórias de semana para semana) que não importam os partidos, acha é que devem ser pessoas novas, com ideias novas, a assumir o cargo. Portanto, levando esta opinião a um extremo, esta pessoa acha que deve votar na pessoa mais jovem ou mais *novidade*, independentemente das suas ideias serem uma valente bosta. Se isto faz, genuinamente, sentido a alguma alma, a questão que se impõe é: onde é que estacionaste a nave espacial?
Sob a velha (e ignorante) perspectiva do "ah, os políticos são todos iguais, mais vale votar neste que a gente já conhece / é do meu clube / já vi este senhor na televisão", a coisa consegue piorar. É escolher, deliberadamente, uma porcaria, sabendo que é uma porcaria, cujo cheiro já é familiar. Foi assim que ficámos dez - atenção, DEZ! - anos com o pior múmia... presidente de que há memória, nesta pequena e mal afortunada República.