Só quem vir estas três imagens (a primeira é a genuína que despoletou o "escândalo", as outras duas são criações que pretendem gozar com o facto, caricaturando-o) e não perceber onde está patente o racismo (só sendo imbecil, adianto eu) é que poderá defender a marca.
Que tal tirar a cabeça de dentro do orifício escuro e bafiento em que se encontra, ousar sair da posição de privilegiado e ganhar vergonha na cara?
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Não é a unanimidade que atesta o valor de alguém ou da sua obra. Não é por ter sido um ícone musical da sua geração que o Zé Pedro deixa um generalizado sentimento de perda em, arrisco dizer, toda a gente. A morte do Zé Pedro comove toda uma nação, independentemente de se gostar ou não da música dos Xutos. [Eu gosto, muito, e perdi a conta ao número de concertos dos Xutos a que assisti, em tantas ocasiões e palcos diferentes, da Festa do Avante a concertos privados, a cantar cada refrão.] A morte do Zé Pedro não precisa de artigos nos jornais a recordar os seus feitos ou a limpar as suas nódoas, porque o seu valor - sobretudo humano - não deixou margem para dúvidas em vida. O Zé Pedro ganhou-nos o respeito e admiração de cada vez que falava em público, com sinceridade e sem peneiras, como um amigalhaço de toda a gente, como um de nós, com as suas merdas, com dias maus, com bondade e alegria, com erros e com sonhos; de cada vez que falava dos seus problemas de saúde, dos vícios que deixou para trás, da música ou do amor, cada um de nós era um bocadinho Zé Pedro.
A comoção nacional com a morte do Zé Pedro não se pode fingir, não se pode contornar, não é passível de indiferença. Não há qualquer margem para polémicas e divergências. Qualquer homenagem que se lhe faça é merecida porque todos temos o Zé Pedro num cantinho do coração. Qualquer pequena manifestação de pesar pela morte do Zé Pedro tem de sobra aquilo que falta em outras, movidas por interesses, pelo politicamente correcto, por tentativas de limpeza de vidas cheias de podridão opressora e exploradora: honestidade.
Tomara que quando eu morra, me recordem assim, pelo sorriso e por nunca ter traído a minha classe em palavras ou em actos, por ser igual para todos, por igual.
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Importa notar que não há, não faz sentido que haja, não pode haver (!), uma "guerra" entre o ensino público e o ensino privado.
A questão por detrás da demasiado empolada celeuma com os contratos de associação deveria ser, para qualquer pessoa com dois dedos de testa, absolutamente óbvia. Se não há alternativa pública em determinada área, ou deve o Estado criar essa alternativa ou deve, aproveitando as sinergias já existentes, financiar parcialmente o ensino privado nessa área. Existindo suficiente oferta pública, não faz o menor sentido que o Estado financie o ensino privado. Ninguém obriga pais e alunos a mudar de escola, como tanto se tem ouvido e lido por aí. Claro que têm todo o direito de preferir e escolher o ensino privado, também há quem prefira andar de Rolls Royce em vez de andar nos Mercedes da Carris; o que não cabe na cabeça de ninguém é que o Estado financie o Rolls Royce, ou o ensino privado, quando esta oferta é supérflua. Posto isto, e assumindo desde já um velho e embutido preconceito em prol do ensino público, exerço o meu direito de discordar em absoluto dos amarelóides e de grande parte dos outros, ou seja, de todos os que partem do princípio de que o ensino particular é melhor ou superior ao ensino público.
Em primeiro lugar e como sempre, esta é apenas a minha opinião, pessoal e intransmissível. Mas é uma opinião fundamentada numa longa, longuíssima carreira de estudante, sempre no ensino público. Tirando o pré-escolar (no meu tempo não havia oferta nem frescuras), que passei numa ama, que era no fundo uma avó sem laços de sangue, só estudei no ensino público. E não foi coisa pouca: tudo somado, 22 anos! Ensino até ao 12° ano em 3 escolas (primária, ciclo e secundária). Depois uma licenciatura de 5 anos, com estágio no mesmo estabelecimento. Algum tempo depois, uma pós-graduação. E depois um mestrado. E passados uns anos, já em pleno exercício da minha actividade profissional e com todos os condicionalismos que isso implica, uma outra licenciatura, num outro estabelecimento de ensino superior público.
Porquê? Porque pude. E podendo, escolhi, e escolheria sempre, o ensino público sobre o privado. Só de pensar em liceus particulares, nas fardas e no mundo hermeticamente fechado a que os putos se acostumam como se aquela amostragem representasse o mundo real, dá-me arrepios. Obviamente que compreendo quem não tem melhor alternativa por mil motivos, quaisquer que sejam. O que não engulo é que se pense que (no ensino e no resto, aliás) "se é mais caro, é melhor". Pelo menos no meu meio e na altura dos meus 17/18 anos, só ia para uma universidade privada quem não tinha notas suficientemente boas para entrar numa universidade pública. Não será grande novidade, se em Portugal e na zona de Lisboa pensarmos no melhor sitio para estudar Ciências, é a FCUL, se pensarmos no melhor sítio para estudar engenharias, é o IST (e o ISEL não se fica muito atrás), para Letras é a FLUL, para Arquitectura é a FBA, para Direito a FDL, por aí fora.
Se as condições foram alguma vez as ideais? Não, nunca. Nem lá perto.
A primeira manifestação em que participei foi precisamente pela melhoria de condições da minha escola secundária (algures pelo 7° ou 8° ano), porque tínhamos aulas nuns "galinheiros" de paredes de esferovite onde chovia no inverno e cozíamos no verão. Nem sempre tive como opção possível algumas disciplinas que gostaria de ter. Nem sempre tive professores excelentes. Tive uma professora de História que só aparecia de 15 em 15 dias. Houve um ano em que tive 3 professores de matemática diferentes. Tive uma professora que tinha medo de sair sozinha da aula porque uma aluna da escola a tinha ameaçado. Mas também tive professores excepcionais, capazes de nos ensinar, motivar e influenciar. Estive em turmas com sérios problemas comportamentais, vi colegas serem "cumprimentados" pelos pais (que tinham sido chamados à escola) com bofetadas antes de qualquer palavra. Tive colegas cujo ritmo de aprendizagem era mais lento e, por isso, condicionavam o ritmo de progressão de toda a turma. Tive colegas repetentes, de todas as cores e tamanhos e origens. Tive turmas maioritariamente masculinas, cheias de motoqueiros armados em bad boys. Tive de lidar sozinha com tentativas (goradas) de bullying. Tive de confrontar uma professora demasiado permissiva com o boicote diário que ela permitia a quem queria aprender. Tive colegas com deficiências físicas, e outros que eram atletas de primeiríssimo nível, tive colegas ricos, outros muito pobres, tive colegas católicos, outros muçulmanos, outros agnósticos, outros ateus. Já na faculdade, convivi com colegas que tinham feito o secundário em liceus privados e muito caros, e com quem andava quilómetros diariamente para chegar à sua escola secundária algures no distrito da Guarda. Uns chegavam de descapotável, outros de transportes públicos, outros de cadeira de rodas empurrada por familiares. Havia militares, pessoal a fazer segunda licenciatura e que já trabalhava, um velhote que andava por lá a passar a reforma, uns que tinham ido parar ao curso errado na esperança de obter equivalências e mudar para o curso que realmente queriam.
Toda esta diversidade compôs o melhor ambiente de ensino que eu poderia desejar, por ser tão representativo do mundo real. É que a escola deve ensinar muito mais do que o que vem escrito nos livros. Foi no ensino público que aprendi a tolerar e respeitar as diferenças, todas as diferenças. Descobri que podemos encontrar amigos e aliados em quem menos esperamos. Percebi que o que era garantido na minha casa (seja em termos económicos ou disciplinares até coisas tão básicas como normas de higiene) não o era na casa do meu colega do lado. Aprendi a não ter vergonha de ser boa aluna e a desenrascar-me por mim própria mesmo se os professores falhassem, se chovesse em cima dos livros e o diabo a sete. Ganhei resiliência. Sobrevivi a dias de doze horas de aulas sem intervalos e a dias de "furos" de oito horas. Aprendi a lidar bem com mudanças bruscas e novos desafios, enfrentei todas as reformas educativas em cada ano inicial da coisa, qual cobaia. Criei uma carapaça quase imbatível de resistência à frustração. Aprendi que os dogmas só o são até serem substituídos. Aprendi que a vocação de cada um é tudo, mas pode não ser suficiente. Aprendi que a vida não é justa, nem tem garantias, e que o caminho mais fácil/previsível/regular normalmente não tem piada nenhuma. Aprendi que se não for cada um de nós a lutar pelos nossos direitos e pelos nossos objectivos, ninguém o fará por nós. Até aprendi a estudar, aprendi a aprender e, o mais útil de tudo, aprendi a ser quem quero ser.
Poderão dizer-me que a minha visão é toldada por ser parcial e não conhecer o reverso da moeda, mimimimi. Só que conheço. Pese embora a minha única experiência com o ensino privado tenha sido na perspectiva de docência, infelizmente pude confirmar que a maior parte das minhas ideias feitas só pecavam pela parcimónia. O ensino privado é, antes de mais, um negócio, e visa principalmente obter o máximo de lucro. Se o ensino é de qualidade, se a oferta lectiva é adequada às necessidades da sociedade e do mercado de emprego, ou se é garantido o bem-estar dos alunos são pormenores - ou pelo menos assim parece! Não querendo extrapolar do particular para o geral, posso dar como termo de comparação os conteúdos programáticos das disciplinas que leccionei e que eram, em dois semestres da universidade privada, inferiores em quantidade e detalhe àquilo que aprendi em apenas um semestre enquanto aluna numa universidade pública. Quanto a condições, eram fracas (equipamento manifestamente insuficiente e horários anti-pedagógicos, por exemplo, até alguns casos extremos de não haver cadeiras suficientes nas salas de aula para todos os alunos), mas nem foi isso que me chocou mais. O que me deixou realmente espantada (e triste) foi o facto dos meus alunos - de cursos com propinas mensais entre os seiscentos e os mais de mil euros - não reivindicarem mais e melhor do que aquilo que lhes era apresentado. Perguntei-lhes porque não reclamavam e as respostas oscilaram entre ombros encolhidos e um tom resignado de "não vale a pena"...
Nas "piores" das escolas públicas não é raro encontrar alunos brilhantes. Mas, ao contrário do que eu pensava há alguns anos, no ensino privado nem todos os alunos são limitados. Pese embora não me tenha cruzado no ensino superior privado com nenhum aluno excepcional, tive alguns bons alunos, muito capazes e inteligentes. Mas talvez por serem, de alguma forma, privilegiados (não é quem quer que pode dispender mensalmente de 600 a 1000 e tal euros para pagar propinas, é só quem pode!), não lhes ocorria exigir o mais essencial do que quantias tão avultadas deviam servir para pagar.
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Aplicável a estágios, horas extraordinárias, e muitas mais situações a que as políticas liberais de direita têm conduzido, um pouco por todo o mundo, está - ou antes, deveria estar - um princípio que me parece basilar, de tão óbvio, mas ao mesmo tempo tão ignorado (quer por patrões gananciosos como por trabalhadores amedrontados).
O trabalho paga-se.
É só isto. Tão simples. Se a entidade empregadora tem comigo, trabalhadora, contratualizado um horário de trabalho, o que me é pago é o tempo. Ou seja, vendo o meu tempo de trabalho (35 ou 40 horas por semana) em troca de remuneração. Se tenho um vínculo à tarefa, como nos famosos "recibos verdes", o que vendo é a execução de uma tarefa ou conjunto de tarefas. Mas de borla não trabalho, meus amigos, de borla chama-se voluntariado, e não trabalho.
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Pese embora a Sr.ª D. Isabel Jonet (só) diga enormidades que me fazem rosnar e espumar dos cantos da boca... Pese embora ainda o cariz dúbio da caridadezinha... bem como as negociatas que a mesma envolve... Eu contribuo para as campanhas de recolha de alimentos do Banco Alimentar. Sempre. Desde sempre (era pré-adolescente e já fazia questão de contribuir com alguma coisa, mesmo que só um Kg de arroz ou de esparguete). Porque sejam quais forem as perdas pelo caminho, há muita gente (mas mesmo muita gente!) a depender desta ajuda para comer. E não é razoável virar as costas a quem precisa.
Muitas coisas podem estar erradas com o processo, e estão. Há muitas associações a lucrar com o negócio da solidariedade, há "voluntários" que são empregados sem contrato, mas auferem vencimento e muitas vezes também prestação social, há gestores destas associações que andam de Porsche, há despensas de quem não precisa cheias com os alimentos doados. Há parcerias comerciais com marcas que aproveitam a publicidade para vender mais, há toda uma margem de lucro que vai direitinha para os cofres das superfícies comerciais, há os impostos que vão ter aos cofres do mesmo Estado que deveria ser a primeira entidade a dar o exemplo e ajudar as famílias carenciadas. Há a visão burguesa e desfasada da realidade portuguesa a dar a cara pela causa, quiçá prejudicando a mesma.
Mas há também muita ajuda a famílias carenciadas que depende das parcerias com o Banco Alimentar, e há, sobretudo, muita fome e necessidade. Não é legítimo virar a cara e, em pondendo, não ajudar desta forma - a não ser que se consiga ajudar de uma forma mais abrangente, ou efectiva. Em última análise, há que saber destrinçar a causa das pessoas que a gerem e das vicissitudes inerentes. E a causa merece, infelizmente, toda a colaboração possível. Enquanto houver pobreza em Portugal, eu contribuo para o Banco Alimentar.
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Por uma qualquer razão, seguramente de natureza kármica (em jeito de punição por terríveis malfeitorias que terei perpetrado numa encarnação anterior), na segunda-feira vi-me na companhia de três dos directores da empresa onde passo eternidades a tentar endireitar o que nasceu torto. Isto logo pela fresquinha, à volta duma mesa de refeição que se pretendia informal - tanto esforço colocado nos pacotinhos quase vazios de compal, tão pouco sucesso.
Ora, logo no rescaldo das eleições, em que uma pessoa fica doente dos nervos (pois não há como não), dormiu pouco porque ficou a fazer zapping entre os comentadores da TV e a aguardar resultados mais concretos (talvez apenas para poder dormir com a certeza de que Marinho Pinto não poria os pés na casa da democracia), e desertinha de ter alguém com quem desabafar impropérios e barafustar contra o sentido de voto da maioria minoritária.
Em vez disso, o que encontra? Pérolas de sabedoria de pessoas que, creio que de forma similar aos senhores ministros, não fazem uma puta de uma ideia do que se passa no mundo real, mas pensam que são donos e senhores da razão, lá do alto das suas gravatas italianas e carros de alta cilindrada com emissões dúbias de gases de estufa.
Um deles, que chegou atrasado porque o trânsito estava mau, achava que até era bom sinal, mais pessoas a andar de carro era um sinal de confiança e tal. Eu tentei, sem revirar muito os olhos, explicar que era início do mês, as aulas já recomeçaram e estavam a cair as primeiras chuvas, que fazem os popós deslizar como no gelo e provocam toques e acidentes. Caras de ponto de interrogação e voltam a falar do tempo e do futebol, pois claro - nem havia nenhum tema mais importante a comentar.
Depois o big boss torna a falar da "retoma", e enquanto alguém se queixa dos transportes públicos, dita a verdade que (des)conhece, do alto do seu super-ego (sabem aquelas pessoas que quando falam decretam coisas, de tão plena e honestamente convencidos que estão de serem os detentores das verdades absolutas? Isso.). Ficámos então todos a saber que os nossos transportes públicos "nem são nada maus". São é pouco utilizados pelas "pessoas" (esse conceito vago, lato e sobretudo distante). "Não são nada caros" (para quem tem ordenado de CEO, acredito que não) e "até são eficientes". A última vez que o senhor em questão usou transportes públicos, não sabemos, ora, carro da empresa tem há mais de duas décadas, classe executiva da TAP não conta, é fazer as contas, como diria o outro.
Vou passar a ter esta verdade de bolso à mão quando estiver, mensalmente, a pagar cerca de 12% do salário mínimo nacional pelo passe (tenho sorte, o L12 basta-me), quando os comboios se atrasarem, quando o metro estiver tão à pinha que tenho de escolher entre o submeter as minhas articulações inflamadas e doridas à massagem espalmatória a 360 graus, qual surround sound, ou o deixar passar aquele metro e ficar uma hora inteirinha no cais a aguardar o barco seguinte ao que deixei fugir.
Juro que não se trata apenas do preconceito que tenho para com "os ricos"; é mais que isso. É isso aliado aos anticorpos que já tenho (muitas vacinas, meus caros...) contra o discurso snob, duma altivez cavaquista, de quem tem convicções profundas sobre realidades de que não se conhece sequer a casca, muito menos o cheiro e o que custa no lombo.
... Mazé trabalhar, ó!
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Cabelo comprido, sujo e desalinhado, gabardine, que já teve outra cor por baixo do encardido, vestida sob o calor imenso do fim de Julho. Passou por mim, mais um anónimo nas ruas da cidade, nas estatísticas do desemprego, diluído nas misérias que proliferam ao ritmo dos enriquecimentos dos mais ricos desta terra.
Limpava duas lágrimas grossas com os dedos, sobre as faces vermelhas de sol ou de raiva ou de vinho - não interessa. Fico com esta imagem colada às retinas, raios partam esta imbecil empatia, incontrolável, que me empola as sensibilidades e faz-me ter de lutar contra as lágrimas se não estou só, nas situações à partida improváveis. [Aprendi desde cedo a contrabalançar com brutalidade e pragmatismo tais que consigo deixar os outros chocados. Óptimo. Tudo menos ser chorona ou queridinha.]
Penso se será o toque das suas próprias mãos o único que sentiu hoje, esta semana, nos últimos meses. Penso em mil motivos que podem justificar aquele choro. Uma zanga, fome, rejeição de uma última esperança, uma filha que passou e não o reconheceu. [A minha mente melodramática está sempre a produzir argumentos televisivos, em todos os pormenores quotidianos, até a sonhar.] Penso, inevitavelmente, quão sortuda eu serei por desconhecer o tal motivo. Que podia ser banal e desinteressante como o seu clube de coração ter perdido um jogo. Só que eu sei que não era, e não sei como sei.
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Os coitadinhos, mesmo vivos, já me irritam solenemente. Irritam-me as pessoas que chamam os outros de coitadinhos, diminuindo-os, e ainda mais me iriam os coitadinhos profissionais, os que fomentam a imagem de coitadinhos e ainda acham que essa é uma boa maneira de obter algum ganho pessoal. Ai, coitadinho de mim, que trabalho tanto, que tenho tantas dificuldades, que tenho aqui uma dor. Em suma, tenham lá pena de mim, que sou *pequenino*.
E depois há a outra raça, dos que passam a ser coitadinhos porque morreram. Mesmo que, quando vivos, tivessem sido os maiores bandalhos, patifes, cabrões, filhos da puta. Mas se agora estão mortos, coitadinhos, deixá-los lá descansar em paz. Como se a morte fosse só por si castigo por todas as malfeitorias e apagasse as mesmas e suas consequências. "Então mas agora o que queres tu fazer, ir buscá-lo ao além para dizer-lhe umas verdades na cara"? Não é necessário, digo à mesma e se o mortos ouvirem, melhor.
Que nojo é este em que nos estamos a tornar? Ainda há uns meses eram todos Charlies, os mesmos Charlies que apontam e olham desconfiados para pessoas com outra cor de pele, ou com um traje diferente!
Não se conhece e não se compreende o que está escrito num livro e até se assume que é um outro livro - e se fosse? Por favor, alguém que me explique porque é que ler o Corão constitui algum tipo de ameaça!
Eu li o Corão quando era adolescente, da mesma forma que li a Bíblia e os Versículos Satânicos do Rushdie, e o Evangelho Segundo Jesus Cristo do Saramago e O Capital de Marx, e muitas dezenas de outros, até policiais manhosos e os livros condensados das Selecções. E Torga, e Urbano Tavares Rodrigues, e Sartre, e Jorge Amado... E se me apetecer levar o Corão na próxima viagem de avião, isso é motivo para me mandarem prender e interrogar?
Nestas alturas, e digo isto com a maior sinceridade, fico grata por não ter filhos. Não estou preparada para trazer alguém a este mundo a quem tivesse de explicar estas idiossincrasias, nem a Humanidade merece ter grande futuro enquanto isto for tudo aceite como se não se passasse nada de absolutamente aberrante e perverso. É que este tipo de segregação também é terrorismo. Livros considerados proibidos e perigosos e subversivos eram outra coisa aqui há umas décadas. Caminhamos para lá novamente?
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O ideal para qualquer criança era ter um lar saudável, um pai e uma mãe, dois avôs e duas avós, todos com muito amor e respeito para dar, carinhosos, sensatos, pacientes, com conhecimentos de pedagogia, psicologia, medicina e já agora magia.
Mas não há famílias ideais, nunca houve. Nada na vida é ideal. Todas as famílias têm questões a resolver, não há pessoas perfeitas, e há muitas pessoas (infelizmente demasiadas) sem a mais pequena aptidão para ter filhos (nem sequer estou a falar das condições - higiene, segurança, estabilidade). Pais que abandonam, maltratam, vendem, molestam, torturam os próprios filhos, são chocantes e deixam-nos perplexos, mas não são raros. Se estas pessoas deviam ter filhos? Obviamente que não, diz a razão, obviamente que sim, diz o livre-arbítrio e a lei.
Famílias disfuncionais são ainda mais, e por múltiplos e variados motivos. Às vezes as consequências para os menores são devastadoras e estes são afastados da família.
De facto, há inúmeras crianças pelo mundo fora que nunca tiveram pais, uma família, um colo. Por outro lado, há imensas pessoas que não conseguem ter filhos, ou que conseguem mas querem adoptar, sejam quais forem os seus motivos. Algumas destas pessoas são sozinhas, outras vivem como casais. Pessoas de todas as cores, credos, nacionalidades e tamanhos. Umas são mais ricas, outras mais pobres. Pessoas todas diferentes, algumas que já têm família, e até outros filhos, outras que querem dar uma família a alguém. Alguns dos casais que querem adoptar são casados, outros não; alguns são casais heterossexuais, outros são casais homossexuais. O que é que isso interessa?! Os casais separam-se, divorciam-se, afastam-se, tornam a casar; as famílias abarcam filhos de casamentos anteriores e posteriores, parentes, irmãos, tios, primos... Porque há-de a lei privar tantas crianças de acederem a essa felicidade que é não estar sozinho no mundo?! Porque tem a lei de impedir que algo tão natural como constituir família esteja vedado a casais homossexuais? Alguém retira filhos às mães solteiras por não fornecerem uma figura paternal às crianças? As famílias monoparentais estão porventura condenadas a traumatizar as crianças? A alternativa que a lei e o estado fornecem é deixar as crianças crescer num ambiente institucionalizado de regras e sem figuras-modelo. É isto que queremos fomentar, uma sociedade ainda mais desumanizada?
Podia continuar por capítulos inteiros. Esta temática envolve questões tão importantes quão delicadas, e há muitas questões cuja resposta formal do estado português não entendo, de todo. Mas disto não me restam dúvidas:
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Há a malta que encolhe os ombros. Que se entrega ao conformismo. Normalmente são os que dizem que a vida “vai andando”. Malta que se queixa que não pode, que não tem, que nunca vai, que é difícil, que dói aqui e acoli. Malta que se escuda no “não sou capaz”, no “eles é que mandam”, no “são todos iguais”. Porque tem espinhas, porque tem casca, porque tem osso, porque tem côdea, porque está frio, porque está calor, porque é tarde, porque é muito cedo, porque dói a barriga, porque são horas de jantar, porque joga o Benfica (aqui no final, claro plágio aos Deolinda).
E tu, és dessa malta?
E que tal ser diferente? E que tal arregaçar as mangas e começar a diferença aqui e agora? Se queres um mundo diferente, faz a tua parte. Todos juntos somos mais, somos maiores, podemos mais, podemos tudo. Muda o teu mundo. Transforma o que podes em teu redor. Não podes, sozinho(a) acabar com a fome no mundo, mas podes pagar um hamburguer a um sem-abrigo. Ou podes ajudar o Banco Alimentar contra a Fome. Não podes reverter as emissões de CO2 sozinho(a), mas podes andar a pé em distâncias curtas, preferir produtos locais e poupar energia. Não podes sozinho(a) impedir a fuga aos impostos, mas podes pedir (ou passar) facturas. Não podes acabar com todo o crime, mas podes denunciar os que testemunhas. Não podes sozinho(a) limpar a tua cidade, mas podes não sujar e ensinar alguém. Não podes adoptar todas as crianças sem protecção, mas podes dirigir uma parte dos teus descontos de IRS para a AMI ou a Unicef. Não podes evitar todos os maus tratos para com as animais, mas podes assinar uma petição a pedir alteração na legislação. Não podes mudar sozinho(a) a governação do teu país, mas podes votar em quem acreditas. Não podes abolir toda a violência, mas podes não recorrer a ela. Não podes mudar tudo o que está mal, mas podes reclamar. Não podes acabar com todo o sofrimento, mas podes oferecer sorrisos.
Podes não conseguir realizar todos os teus sonhos do pé para a mão, mas podes não desistir e lutar por eles.
São os pequenos passos. Muitos passos pequenos fazem-nos chegar tão longe quanto quisermos. São as pequenas coisas. Muitas coisas pequenas fazem uma imensidão.
Faz a tua parte!
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A ler o jornal, sobre os efeitos da crise, ponho-me a reflectir. Há coisas que a minha mente se revela tacanha demais para alcançar. O consumismo por impulso, como substituto de necessidades mais profundas da alma, está clinicamente documentado. Mas o consumismo para manter as aparências, o viver acima das possibilidades, parece ser uma realidade instalada no quotidiano nacional, e eu não consigo compreender que valor é visto em certos bens em detrimento de outros. Como pessoas que vão ao supermercado comprar bens essenciais com o dinheiro contado (e insuficiente) dizem que só usam ténis de marca, não percebo. Como há famílias de classe média a subsistir graças aos apoios do Banco Alimentar mas não abdicam de carros de alta cilindrada e telemóveis topo de gama, não percebo. Que doença social é esta que troca as prioridades de pessoas reais (e não estou a falar do jet-set, dos deslumbrados, falo dos vizinhos next-door), que preferem passar necessidades a perder uma pose elitista que os arrasta para um fosso de endividamento?
Sinceramente, não percebo. E adorava que me explicassem.